‘Compre com um clique’, é com essa frase que começa o documentário Buy Now: The Shopping Conspiracy, da Netflix, que faz severas críticas à indústria de bens de consumo. Lançado às vésperas da Black Friday — evento que surgiu nos Estados Unidos e atravessou fronteiras —, a data movimentou impressionantes R$ 7,2 bilhões no comércio eletrônico em 2023 aqui no Brasil. Para 2024, a estimativa da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) é de um faturamento total em torno de R$ 5,22 bilhões.
Compulsão ou consumismo? Como identificar?
Em um cenário repleto de estímulos e marcado pelo esforço constante das marcas para incentivar o consumo contínuo, as respostas dos consumidores podem variar. Segundo um levantamento realizado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), 8% da população mundial sofre com a compulsão por compras. O transtorno é caracterizado pelo comportamento repetitivo de gastar de forma descontrolada, com uma dificuldade latente de resistir a esse impulso. Para compreender melhor esse tema, conversamos com a psiquiatra Dra. Cintia Braga.
O primeiro ponto levantado com a médica foi: quando é possível identificar o transtorno de compra compulsiva e como ele se diferencia de outros comportamentos relacionados a compras?
Segundo a psiquiatra, o transtorno é caracterizado por episódios recorrentes de compras realizadas de forma impulsiva, que trazem sofrimento significativo e prejuízos para a pessoa. “Geralmente, são aquisições aleatórias, marcadas por uma sensação de perda de controle sobre o ato de comprar”, explica.
Além disso, o comportamento impulsivo é acompanhado por um alívio e prazer momentâneo no momento da compra, sensações que, muitas vezes, duram apenas alguns segundos. No entanto, os impactos são duradouros, afetando a vida pessoal e financeira de maneira significativa.
“Mesmo reconhecendo os prejuízos, pessoas com o transtorno frequentemente não conseguem controlar o impulso de comprar. Diferentemente de padrões mais comuns de consumo, como o aumento de compras em épocas específicas, o transtorno não está ligado a características sazonais, sendo um padrão constante na vida de quem sofre com o problema.”
Transtorno compulsivo por compras: como é feito o diagnóstico?
A psiquiatra Dra. Cintia Braga explica que o diagnóstico do transtorno de compra compulsiva é essencialmente clínico e deve ser realizado por um psiquiatra. “É necessário investigar a história da pessoa, entender a duração e frequência dos sintomas, além de avaliar o impacto desse comportamento na vida dela”, destaca.
Outro ponto importante é a exclusão de comorbidades, como transtornos de humor que podem apresentar características semelhantes, como impulsividade em episódios de hipomania ou mania.
“Existem elementos que ajudam a diferenciar essas condições, o que é fundamental, já que o tratamento para cada uma delas é bastante distinto”, ressalta a médica.
Fatores de risco e o ciclo do transtorno compulsivo por compras
De acordo com a psiquiatra, diversos fatores de risco estão associados ao transtorno de compra compulsiva. Entre eles, destacam-se características de personalidade, como impulsividade e baixa tolerância à frustração. A hereditariedade também desempenha um papel relevante, já que a presença de transtornos em parentes próximos pode aumentar a predisposição.
“A história de vida da pessoa é fundamental para entender o desenvolvimento do transtorno, assim como as comorbidades que podem estar presentes, como transtornos de humor, ansiedade e TDAH, que tem a impulsividade como característica marcante”, explica. Outros transtornos compulsivos e o uso de substâncias também podem estar associados ao quadro.
A médica ressalta que as emoções, especialmente angústia e ansiedade, são fatores centrais no desenvolvimento do comportamento compulsivo. “Comprar muitas vezes funciona como uma forma de regulação emocional, aliviando momentaneamente sentimentos como vazio ou angústia. No entanto, esse alívio é breve e geralmente seguido por culpa e arrependimento”, afirma.
Esse padrão cria um ciclo vicioso: a pessoa compra impulsivamente para aliviar o desconforto emocional, mas, após a compra, sente intenso mal-estar, intensificando o desejo de repetir o comportamento. “Isso é muito diferente de uma compra planejada ou de um gasto ocasional para se recompensar, onde há controle sobre a ação. No transtorno compulsivo, as compras são descontroladas, gerando grande sofrimento”, conclui.
A Cannabis medicinal como aliada no manejo dos sintomas
Dra. Cintia Braga aponta que a Cannabis medicinal pode ser uma ferramenta valiosa no manejo dos sintomas relacionados ao transtorno de compra compulsiva, como ansiedade, impulsividade e angústia.
“Os Fitocanabinoides possuem um papel importante na regulação emocional, reduzindo a resposta ao estresse e promovendo um efeito ansiolítico. Isso contribui para o controle da ansiedade e da impulsividade, além de melhorar aspectos frequentemente prejudicados, como a qualidade do sono”, explica.
Entretanto, ela destaca que o uso terapêutico da Cannabis precisa ser bem prescrito e acompanhado de perto por um profissional qualificado.
Orientações para pacientes e familiares
A médica destaca a importância de observar e compreender os padrões de comportamento relacionados ao transtorno de compra compulsiva. “Quando algo é repetido frequentemente, trazendo culpa e prejuízo, é essencial estar atento a isso. Muitas vezes, a pessoa não tem consciência crítica do problema, por isso, reconhecer esses padrões é o primeiro passo”, explica.
A psicoeducação também desempenha um papel fundamental. “É necessário entender o que é o transtorno e saber que existe tratamento. Em muitos casos, é difícil sair dessa situação sozinho, mas há ajuda disponível”, reforça. Além disso, para ela, identificar os gatilhos que levam ao comportamento impulsivo e agir para minimizá-los pode ser uma bastante estratégia eficaz.
Buscar ajuda profissional é essencial, seja por meio de terapia ou, quando indicado, do uso de medicamentos. “A ajuda de um profissional corta muitos caminhos e facilita o processo de recuperação. Além disso, o acolhimento da família e dos amigos é vital para que o paciente se sinta apoiado e compreendido”, pontua.
Dentre as estratégias práticas, a especialista sugere ações como excluir aplicativos de compras, reduzir ou eliminar o uso de cartões de crédito, estabelecer limites de transações bancárias e evitar PIX ou compras instantâneas. “Essas medidas criam barreiras ao impulso imediato, permitindo que a pessoa tenha tempo para refletir e tomar decisões mais conscientes”, afirma.
Por fim, ela ressalta a importância de medidas que retardem o ato de compra, como a necessidade de ir fisicamente ao banco para sacar dinheiro ou realizar operações financeiras. “Esse tipo de ação dá tempo para que a pessoa raciocine e evite decisões impulsivas, sendo uma abordagem interessante no manejo desse transtorno”, finaliza.
Confira a LIVE sobre Cannabis no tratamento de depressão com a Dra Cintia Braga
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