Em 15 dias, segunda maior Corte do país, concede salvo-conduto para que dois pacientes realizem cultivo de Cannabis no Brasil, para fins medicinaism, sem correr risco de prisão.
Apesar de muita gente ainda não saber, a Cannabis – para fins medicinais – já é regulamentada no Brasil. Isso se dá por meio das Resoluções da Diretoria Colegiada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) RDC 327 e RDC 660. Já o cultivo de Cannabis no Brasil só mediante decisão judicial.
O alto custo do medicamento importado ou até mesmo do que já está disponível na farmácia tem levado inúmeros pacientes a recorrerem à Justiça pelo direito de produzir o próprio remédio em casa. De fato, as histórias dos pacientes têm comovido os ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Desde que a Quinta e Sexta Turmas da Corte unificaram o entendimento sobre o assunto, há quase um ano, a decisão tem seguido sempre no mesmo sentido: de que plantar Cannabis para fins medicinais não configura crime de tráfico de drogas, por falta de tipicidade material.
A Cannabis no tratamento de fibromialgia
Esse foi o principal argumento usado pelo ministro Reynaldo Soares da Fonseca do STJ, em decisão recente (5 de junho), para garantir habeas corpus a uma paciente que sofre de fibromialgia e cultiva a Cannabis para se tratar com o óleo da planta.
No voto, o magistrado sustentou que já existe jurisprudência no sentindo de que é necessária a expedição do salvo-conduto, quando comprovada a necessidade médica do tratamento, para pacientes que cultivam a Cannabis para fins terapêuticos.
A medida, segundo o magistrado, visa a proteger o enfermo que está em defesa do seu direito à saúde, sem risco de ser criminalizado por buscar um direito fundamental.
“Nesse contexto, deve ser confirmada a liminar, para que as autoridades responsáveis pelo combate ao tráfico de drogas, inclusive da forma transnacional, abstenham-se de promover qualquer medida de restrição de liberdade, bem como de apreensão e/ou destruição dos materiais destinados ao tratamento da saúde do paciente, dentro dos limites da prescrição médica”, declarou na decisão monocrática.
Ganhou na liminar e no mérito
De acordo com o advogado da ação, Murilo Nicolau – especializado em direito canábico – além da liminar, a paciente também já ganhou no mérito da ação. A partir de agora, ela tem o direito de cultivar e produzir seu próprio remédio sem correr o risco de ser presa.
“O Habeas Corpus traz segurança mental para o paciente. Essa paciente tem cerca de 50 anos e entrará em aposentadoria por causa da fibromialgia. Ela já cultivava na ilegalidade. Mas agora, terá a tranquilidade de estar amparada pela Justiça”, explica o advogado.
Outra decisão semelhante do ministro do STJ, Rogerio Schietti Cruz (dia 19 de maio), seguiu o mesmo entendimento. O ministro Schietti deu provimento a um recurso para autorizar um homem diagnosticado com o quadro de ansiedade generalizada a plantar e cultivar de 354 a 238 pés de Cannabis por ano.
STJ cria jurisprudência favorável ao cultivo
O advogado Murilo Nicolau, que também atuou nessa outra ação, lembra que perdeu inicialmente no primeiro e segundo grau. Entretanto, quando as ações chegam no STJ, praticamente 100% recebem sentença favorável ao direito do paciente, explica o advogado.
Nicolau detalha ainda que o ministro Schietti, primeiramente, negou a liminar, por entender que necessitaria de mais subsídios para quantificar a produção do paciente.
Entretanto com o plano de cultivo em mãos, a decisão foi favorável na análise do mérito. “O plano de cultivo foi essencial para a tomada de decisão. O documento serve para dar mais segurança ao juiz”, afirma Nicolau.
Restrições
Na decisão, Schietti impõe algumas restrições, como por exemplo: veda a comercialização, doação ou transferência da matéria-prima ou dos compostos derivados da erva para terceiros.
Nesse caso específico, o paciente apresenta um quadro de ansiedade generalizada desde a infância, com fortes dores de estômago, distúrbios do sono e refratariedade ao tratamento convencional.
Munido de prescrição e laudo médico, o paciente comprovou que tanto o óleo da Cannabis, como a vaporização das flores, eram tratamentos que traziam mais qualidade de vida para sua rotina. Além disso, também havia o alívio do quadro sintomático da doença.
“A nossa estratégia é trabalhar cada caso de forma personalizada. Além de um laudo bem fundamentado, também é preciso apresentar receita médica. É fundamental também autorização de importação da Anvisa, curso e plano de cultivo”, ensina Murilo.
Apesar das decisões relativas à concessão de salvo-conduto não apresentarem força vinculante, ou seja, não valerem para todas as Cortes do país, a jurisprudência já é uma realidade. Em outras palavras, a resolução favorável ao direito de saúde do paciente já está sendo garantida pelo Judiciário.
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