A retomada do julgamento que pode descriminalizar o porte de drogas no Brasil está marcado para o dia 02 de agosto
O Supremo Tribunal Federal (STF) remarcou, mais uma vez, a retomada do julgamento que pode descriminalizar o porte de drogas para consumo no Brasil, desta vez para o dia 02 de agosto.
O julgamento do Recurso Extraordinário 635.659, interposto a favor de Francisco Benedito de Souza, questiona a constitucionalidade do artigo 28 da chamada Lei de Drogas (11.343/2006).
O dispositivo criminaliza o usuário que compra, guarda, mantém em depósito ou transporta entorpecentes para consumo pessoal no Brasil. A punição varia de advertências, à prestação de serviços à comunidade e medidas socioeducativas.
Cabe ao Estado punir quem age em prejuízo próprio?
Provocada pela Defensoria Pública de São Paulo, a Suprema Corte vai analisar se o referido artigo contraria a Constituição Federal e se cabe ao Estado punir alguém que age em prejuízo próprio.
Esses são os principais argumentos apresentados pela Defensoria Pública. Para o órgão, a criminalização de condutas que dizem respeito à intimidade e à vida privada, fere os direitos resguardados pelo artigo 5º da Lei Maior, a Constituição Federal de 1988.
Relembre o caso
Francisco Benedito de Souza foi condenado a prestar serviços comunitários depois de ser flagrado com três gramas de maconha na cela onde já cumpria pena, por porte de arma de fogo.
O julgamento, que teve início em 2015, foi interrompido no mesmo ano com um pedido de vista do então ministro Teori Zavascki, que faleceu tragicamente num acidente aéreo em 2017.
Substituído pelo ministro Alexandre de Moraes, a ação foi liberada para julgamento em 2018. Mas o processo continua engavetado há quase oito anos.
Na opinião de especialistas, a Suprema Corte não pautou o assunto nos últimos quatro anos porque estaria tentando evitar mais um embate com o governo de Jair Bolsonaro.
Placar favorável à descriminalização
Dos 11 ministros que compõe a Corte, três já votaram pela descriminalização do usuário. Primeiramente, o relator, Gilmar Mendes, que votou por não criminalizar o porte de qualquer tipo de droga.
Na sequência, os ministros Edson Fachin e Luis Roberto Barroso votaram para restringir a descriminalização do porte apenas para a maconha, uma droga de menor poder ofensivo na visão dos magistrados.
Julgamento suspenso
A retomada do caso, que tinha sido pautada para as sessões de maio e junho, foi sendo paulatinamente adiada. E chegou a virar meme nas redes sociais.
Para o jurista Cristiano Ávila Maronna, advogado do Justa e da Rede Reforma, é uma boa notícia o Recurso voltar à pauta. “A grande preocupação que havia era esse adiamento ‘sine die’, como se diz no jargão jurídico. Um julgamento que não tem data para ser retomado. É a terceira vez que a ministra Rosa Weber inclui na pauta o RE 635.659, isso é um sinal de que ela pretende, de fato, retomar o julgamento”.
De acordo com o jornalista e apresentador do programa Direto da Redação da TV Justiça, Carlos Eduardo Cunha, tudo indica que a presidente da Corte estava à espera da posse do novo ministro, Cristiano Zanin.
“O assunto é polêmico e a Suprema Corte estava com uma vaga aberta. Agora com a posse do Zanin é bem possível que o julgamento seja finalizado. Mas ainda é possível um pedido de vista. Tudo é possível”, analisa o jornalista.
A expectativa agora é se o julgamento será retomado antes da posse do ministro Zanin, marcada para o dia 03 de agosto. “Há uma dúvida se o ideal seria o julgamento ser retomado após ele ser empossado, ou se tudo bem o ministro Alexandre de Moraes ler o voto dele no dia 02. Eu acho que para não perder tempo seria importante o julgamento ser retomado no dia 02”, defende Cristiano.
As drogas não serão legalizadas
A notícia de que o STF poderia descriminalizar a conduta do usuário de drogas movimentou as redes sociais, especialmente de políticos da ala conservadora. Em junho, o senador Styvenson Valentim (PODE/RN) subiu à tribuna para criticar a Suprema Corte:
“Tornar a descriminalização do porte de droga banal? Isso ainda é um freio, ainda restringe, ainda inibe as pessoas de estarem andando…. Daqui a pouco, a senhora está dentro do ônibus, o cara fumando maconha, e não se pode fazer nada”, alertou.
Argumentos contrários
E continuou: “O policial vai abordar o cara com cocaína, com pedra de crack, e não vai poder fazer nada! Daqui a pouco, está o traficante vendendo e diz: “Mas é para o meu consumo, é de meu porte”. Como é que fica este nosso país? Ninguém pensa nisso, não”, questionou.
Ainda que alguns sejam contra a reforma da lei, descriminalizar o porte é diferente de legalizar as drogas. Mesmo se a Corte descriminalize o porte, a venda de entorpecentes continuará ilegal no país.
Outros políticos também criticam a suposta intromissão do judiciário em assunto que deveriam ser tratados pelo legislativo, na visão deles.
“Nesses tempos estranhos que estamos vivendo, mais uma vez ao que parece, o STF vai atropelar uma competência que é do Congresso”, alfineta Eduardo Bolsonaro (PSL/SP).
Aumento do tráfico?
Para o deputado dito conservador, a descriminalização do porte de drogas pode aumentar ainda mais consumo e tráfico.
Já o deputado Vicentinho (PT/SP) reconheceu que o parlamento passou da hora de revisar a Lei de Drogas e tratar o usuário como uma questão de saúde pública e civilidade.
“Precisamos tomar um cuidado muito grande com o assunto das drogas. Há uma grande diferença: uma coisa é a Cannabis que está sendo usada como medicamento, outra coisa são essas drogas sintéticas”, alerta o político que defende a descriminalização apenas da maconha.
Não separa traficante de usuário
Para além da discussão da criminalização do usuário, atualmente a Lei de Drogas não traz uma distinção clara entre usuários e traficantes.
Organizações em defesa da comunidade negra afirmam que qualquer pessoa em posse de quantidades irrisória de droga pode, em tese, ser fichada como traficante. Principalmente, se for negro e pobre.
Enquanto a pena prevista para tráfico de drogas no Brasil varia de 5 a 20 anos de prisão, o crime de porte de drogas para uso pessoal, determina punições mais leves, como prestação de serviços à comunidade.
O julgamento pode reduzir o encarceramento?
Estudos indicam que a atual Lei de Drogas, sancionada em 2006 por Lula, gerou uma “explosão” no número de pessoas presas por crimes relacionados ao tráfico de drogas.
Em 2005, antes da nova legislação, havia 296.919 pessoas encarceradas no país, sendo 14% delas por crimes relacionados ao tráfico, segundo o Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen).
Já em 2019, dado mais recente, eram 773.151 detentos (alta de 160%). Delitos relacionados ao tráfico representavam 27,4% do total de presos — entre as mulheres, esse índice chegava a 54,9%.
Essa lei acabou com a pena de prisão para usuários e aumentou a punição para traficantes. A expectativa era que isso reduziria o número de prisões, mas o efeito foi o oposto, afirma o advogado Pierpaolo Bottini, que era secretário de Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça naquela época.
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