Supremo Tribunal Federal (STF) adia mais uma vez a retomada do julgamento que pode mudar a Política de Drogas do país
Antes de tudo, o plenário priorizou a eleição dos quatro indicados para compor o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A lista é encaminhada ao presidente, Luiz Inácio Lula da Silva, para a escolha de dois novos integrantes da Corte Eleitoral (TSE), na classe de juristas.
Ainda tomou conta da sessão a finalização do julgamento do ex-presidente e ex-senador, Fernando Collor de Melo. O político foi condenado pela Suprema Corte, no último dia 18 de maio, por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, no caso que envolve a BR Distribuidora.
Já o julgamento sobre a criminalização do porte de drogas entrou na fila de espera e pode ficar para essa quinta-feira. Outros processos também fazem parte da pauta de julgamentos, como a dosimetria da pena que será imposta ao ex-presidente Collor, por exemplo.
De acordo com o jornalista e apresentador do programa Direto da Redação, da TV Justiça, Carlos Eduardo Cunha, tudo depende do tempo que os ministros vão dispender para determinar a pena para o ex-presidente, e se a ação sobre o ‘juiz de garantias’ ganha prioridade na pauta.
“Em outras palavras, tudo é possível. Existe a possibilidade de que o julgamento (da descriminalização do porte de drogas) aconteça nessa quinta, e tenha a sua continuidade no plenário do Supremo. Agora, não temos como garantir que isso vai realmente acontecer. Mas, pode ser que sim”, avalia Cunha.
As drogas não serão legalizadas
É importante ressaltar que a ação não diz respeito à legalização das drogas. A venda de entorpecentes, por exemplo, continua ilegal, independentemente do posicionamento final da Suprema Corte.
O que está em jogo é a constitucionalidade do artigo 28 da chamada Lei de Drogas (11.343/2006). O dispositivo criminaliza o usuário que compra, guarda, mantém em depósito ou transporta entorpecentes para consumo pessoal.
Entenda: argumentos da defesa
Provocada pela Defensoria Pública de São Paulo, a Suprema Corte vai analisar se o referido artigo contraria a Constituição Federal e se cabe ao Estado punir alguém que age em prejuízo próprio.
Esses são os principais argumentos apresentados pela Defensoria Pública. Para o órgão, a criminalização de condutas que dizem respeito à intimidade e à vida privada, fere os direitos resguardados pelo artigo 5º da Carta Magna.
Relembre o caso
Mais precisamente, em 2015, o STF deu início ao julgamento do Recurso Extraordinário 635.659, interposto em favor de Francisco Benedito de Souza.
Souza foi condenado a prestar serviços comunitários, depois de ser flagrado com 3 gramas de maconha, na cela onde já cumpria pena, por porte de arma de fogo.
Dos 11 ministros que compõem a Corte, 3 já votaram pela descriminalização do usuário. Primeiramente, o relator, Gilmar Mendes, que votou pela liberação para qualquer tipo de droga.
Na sequência, os ministros Edson Fachin e Luis Roberto Barroso, que votaram para restringir a descriminalização do porte apenas para a maconha. Na visão dos magistrados, a posse da planta deve deixar de ser crime, porque tem menor poder ofensivo.
Julgamento suspenso
A análise do caso parou, ainda em 2015, com um pedido de vista do ministro Teori Zavascki, que faleceu num acidente aéreo, em 2017.
Substituído pelo ministro Alexandre de Moraes, a ação ficou livre e pronta para julgamento em 2018. Mas o processo continuou engavetado. Na opinião de especialistas, a Suprema Corte estaria tentando evitar mais um embate com o governo de Jair Bolsonaro.
E o Congressso?
No Congresso, políticos criticam a suposta intromissão do Judiciário em assuntos que deveriam ser tratados, exclusivamente, pelo Legislativo. Esta, pelo menos, é a visão de grande parte dos parlamentares entrevistados pelo Portal.
Contra
Para defender a manutenção da atual Política de Drogas, o senador Styvenson Valentim (Podemos-RN) subiu na tribuna do plenário. No discurso, o político – que é polícia militar – disse que a descriminalização vai beneficiar os traficantes.
“Daqui a pouco, a senhora está dentro do ônibus, o cara fumando maconha, e não se pode fazer nada. O policial vai abordar o cara com cocaína, com pedra de crack, e não vai poder fazer nada! Daqui a pouco, está o traficante vendendo e diz: “Mas é para o meu consumo, é de meu porte”, afirmou o senador.
O deputado Eduardo Bolsonaro (PSL/SP), dito conservador, também compartilha da mesma visão. Para o parlamentar, a descriminalização do porte de drogas pode aumentar ainda mais consumo e tráfico no Brasil.
“Nesses tempos estranhos que estamos vivendo, mais uma vez ao que parece, o STF vai atropelar uma competência que é do Congresso”, alfinetou o deputado.
A favor
Já o deputado Vicentinho (PT/SP) reconheceu que o parlamento passou da hora de revisar a Lei de Drogas e tratar o usuário como uma questão de saúde pública.
“Precisamos tomar um cuidado muito grande com o assunto das drogas. Há uma grande diferença: uma coisa é a Cannabis que está sendo usada como medicamento, outra coisa são essas drogas sintéticas”, alerta o político, que defende a descriminalização apenas da maconha.
Para além da discussão da criminalização do usuário, atualmente, a Lei de Drogas não traz uma distinção clara entre usuários e traficantes.
Organizações em defesa da comunidade negra afirmam que qualquer pessoa em posse de quantidade irrisória de droga pode, em tese, ser fichada como traficante. Principalmente, se for negro, pobre e periférico.
Enquanto a pena prevista para tráfico de drogas no Brasil varia de cinco a 20 anos de prisão, o crime pelo porte de drogas – para uso pessoal – determina punições mais leves, como prestação de serviços à comunidade.
Dúvidas
Para além da descriminalização, há uma série de questões que também deverão estar nesse julgamento, explica Cristiano Ávila Maronna, advogado do Justa e da Rede Reforma.
“A decisão vai abranger todas as drogas? Ou só a maconha? Os ministros vão adotar critérios objetivos com base no peso e na natureza de cada substância para diferenciar uso e tráfico de drogas?”, questiona Maronna.
Na visão do jurista, o mais importante é que a Suprema Corte estabeleça um standard probatório, com base em provas factíveis para a condenação. “Esse julgamento vai muito além da posse. É a possibilidade de melhorar a Política de Drogas, com redução de danos no Brasil”, avalia o advogado.
Protesto
Do lado de fora, um protesto tímido cobrava mais agilidade no processo paralisado há oito anos. A Stella Francisca, advogada da Rede Nacional de Feministas Antiproibicionistas (Renfa) e do Gabinete Jurídico Antirracista, era uma das manifestantes.
“É muito importante acompanhar e cobrar essa pauta, porque não se trata de descriminalizar apenas a maconha, mas todas as drogas, os negros e mulheres pretas que sofrem o encarceramento em massa”, alerta a ativista.
Igor Aveline, presidente do Instituto BioSer, outro ativista presente no protesto, afirmou que a liberdade individual tem que estar acima de tudo. “O uso de uma planta medicinal não pode ser crime e muito menos o Estado pode interferir na liberdade pessoal de cada um”, defende.
E você? Se identificou com a causa?
Está em busca de tratamento com a Cannabis? Para fins medicinais, a planta já está regulamentada no Brasil, com prescrição médica. Portanto, para saber mais e agendar uma consulta, clique na na nossa plataforma de agendamentos. São mais de 250 médicos experientes na medicina canabinoide, com capacitação para avaliar o seu caso e indicar o melhor remédio.