“Ontem, eu impetrei um Habeas Corpus no IX Jecrim da Barra da Tijuca, sem advogado. Estive sozinha no fórum e conversei com o judiciário para obter meu salvo conduto para cultivar Cannabis para meus três filhos. Hoje tive a resposta favorável da liminar” contou Bruna Fernanda Dias Lima Moraes, carioca mães de três filhos autistas que se tornou, nesta quarta-feira (05), a primeira pessoa no Brasil a conseguir o direito de plantar maconha sem um profissional da advocacia.
“Agora eu posso cultivar maconha para meus filhos sem medo! Qualquer cidadão pode fazer isso! Nós, mães vamos mudar o mundo!”, comemorou a estudante de farmácia, que também é presidente da Associação Humanitária Canábica científica de pacientes de Cannabis.
Contudo, a decisão é em caráter liminar e terá validade de 30 dias. Conforme despacho da juíza Simone Cavalieri Frota, as polícias Civil e Militar do Rio de janeiro estão impedidas de prender a mãe em flagrante pela produção artesanal de 30 plantas, além de apreenderem as mudas utilizadas para o tratamento dos filhos, o Isaque, de 3 anos, a Rebeca, de 5, e o Mateus, de 10.
“A gente quer que isso seja o começo de um grande movimento para que mais mães façam o mesmo e que a gente acelere a legalização nesse país. As mães não podem mais depender de um advogado para tratar seus filhos”, afirmou ao portal Cannabis & Saúde o marido e pais das crianças, Daniel Fernando Moraes, conhecido como Fernando Canabiano pelo seu ativismo pela Cannabis no Rio de Janeiro.
De acordo com a decisão, Bruna juntou aos autos laudos médicos atestando que os três filhos são portadores de síndrome do espectro autista e indicação pelos médicos do óleo de Cannabis para tratamento das crianças.
“Um Habeas Corpus pode ser impetrado por qualquer pessoa”
Apesar do Habeas Corpus ter sido impetrado sem um profissional do Direito, o advogado André Barros ajudou na construção da peça. O jurista foi procurado pela família. Barros explicou que, em função da pandemia e a condição de saúde da sua esposa, não está saindo de casa. Por isso sugeriu que a própria Bruna impetrasse o HC.
“Então eu falei pra ela, mas você pode entrar com o Habeas Corpus. Ela não sabia que podia entrar sem advogado. Então é o primeiro HC sem advogado no Brasil. É importante divulgar o Artigo 654 do Código de Processo Penal, que diz que um Habeas Corpus pode ser impetrado por qualquer pessoa ou para outra,. Agora quem entrar tem que ter consciência de que, se o juiz não conceder a liminar, ele pode expedir um mandado de busca e apreensão. Mas a história da Bruna era muito forte (para ser negado”, explicou o advogado..
Bruna Fernanda apresentou no pedido as autorizações da Anvisa para importação dos medicamentos em nome dos três filhos. Porém, deixou claro que não possuia condições financeiras de arcar com o alto custo dos produtos. E que por isso, em 2017 passou a cultivar para o filho mais velho um óleo artesanal caseiro preparado de Cannabis. Assim, teve um custo acessível e sem risco de interrupção do tratamento.
Fornecimento de medicação importada não era suficiente
No entanto, pelo risco de prisão e perda das plantas, decidiu impetrar uma ação na Justiça Federal para obtenção do remédio importado. Ela foi vitoriosa nesse pedido, pois foi concedida a liminar em favor do primogênito, que recebeu por uma única vez o valor para a compra do medicamento, no ano de 2019.
Embora tenha obtido essa decisão favorável, Bruna argumentou que a demora em receber os valores, o envio do pedido, o tempo de chegada e a liberação da alfândega, fora a burocracia excessiva da Anvisa, estavam impedindo o acesso e a continuidade do tratamento.
E ainda, que haveria a necessidade de estender o benefício para os outros dois filhos, que passaram também a se tratar com o produto. Isso aumentaria ainda mais a dificuldade de tratamento de todos.
Está demonstrado o perigo da demora, destacou juiz
“Diante do exposto, entendo presentes os requisitos autorizadores da medida liminar pleiteada. O fumus bonni iuris (sinal do bom direito) encontra-se presente na vasta documentação médica apresentada e na autorização da Anvisa para importação dos respectivos produtos”, escreveu o juiz .
“O periculum in mora (perigo da demora) encontra-se demonstrado pelo fato de que a paciente encontra-se com sua liberdade ambulatorial ameaçada em virtude de possuir em sua residência plantas sem regulamentação legal, (…) acarretando a destruição das plantas”.
“Sendo assim, defiro o pedido liminar e concedo salvo-conduto em favor de Bruna Fernanda Dias Lima Moraes a fim de que as autoridades coatoras sejam impedidas de proceder à prisão em flagrante da paciente pela produção artesanal de 30 plantas da Cannabis sativa, para fins estritamente medicinais, bem como fiquem impedidas de apreenderem as mudas das plantas utilizadas para o tratamento dos filhos da paciente”, determinou o magistrado.