Ao longo do ano, contamos as histórias de alguns dos mais renomados especialistas da medicina canabinoide no País; relembre as histórias mais marcantes
Menos de 1% dos médicos em atividade no Brasil são prescritores de Cannabis medicinal. Nós, do portal Cannabis e Saúde, trabalhamos para ajudar a mudar essa realidade. A estratégia é contar a história de alguns dos mais renomados profissionais do Brasil, de diversas especialidades, que encontram uma forma de melhorar a qualidade de vida de seus pacientes graças às propriedades dos fitocanabinoides.
Relembre algumas das histórias mais marcantes publicadas em 2021.
Dr. Mario Grieco
“No início carregar água e cortar lenha. Depois que atingir o estado de iluminação, cortar lenha e carregar água”. Com esse ditado Zen, o médico Mario Grieco resume o momento atual de sua carreira. Formado em medicina no ano de 1977, completou sua residência nos EUA até que, por problemas familiares, teve que retornar ao Brasil.
Sua volta, porém, passou longe do consultório médico. Uma oportunidade como assessor médico de uma indústria farmacêutica mudou seu rumo. Fez seu nome atuando principalmente no marketing de grandes companhias, subiu de cargo até chegar à presidência.
Médico prescritor de Cannabis
Uma nova reviravolta veio ao receber o convite para dar início à uma nova empresa, voltada ao promissor mercado de Cannabis. “Durante toda minha carreira, como médico, presidente de empresas, eu sempre me envolvi na área de pesquisa”, conta Grieco. “A Cannabis sempre foi uma coisa que me atraiu bastante. Tinha um certo conhecimento, e me convidaram por isso.”
Se aprofundar na questão deixou evidente para o médico a falta de informações sobre o assunto. Com experiência de três livros com foco em gestão de empresas já publicados, assumiu a missão de desmistificar a adoção das substâncias canabinoides em tratamentos médicos.
Surgia assim o livro: “Cannabis medicinal – baseados em fatos”, lançado em agosto de 2021. “O objetivo é mostrar os dados científicos que existem”, afirma. “Existe muita falácia de que a Cannabis medicinal não tem estudo científico, enquanto são mais de 60 doenças com comprovação científica, referência médica, estudos publicados em revistas internacionais reconhecidas.”
Se basear somente na literatura parecia insuficiente para o médico especializado em medicina da família. “Como você pode lançar um livro sem ter experiência clínica? Não dava para ficar só na teoria. Eu tinha que ter experiência prática”, conta Grieco. “Voltei ao princípio. Às coisas básicas da vida. Cortar lenha e carregar água. Voltei a clinicar.”
Dr. Caio Vieira
Há tempos a Cannabis medicinal estava no radar do psiquiatra Caio José Antônio Vieira. Sempre atento às novidades de sua área, acompanhava animado as pesquisas realizadas na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP), além de, vira e mexe, se deparava com pacientes em busca de tratamento canabinoide. Sobrava vontade de aprender sobre a prescrição, mas faltava tempo em sua atribulada vida de médico da pequena São Sebastião do Paraíso, no sul de Minas Gerais.
Até que a vida o obrigou a parar. Atleta amador, estava correndo na rua quando, em julho de 2020, foi atropelado por um carro. “Precisei fazer uma cirurgia ortopédica grande, que me dava bastante dor. Fiquei dois meses de repouso. Nesse período, eu não estava aguentando de dor.”
Com fratura na clavícula, teve que ser submetido a um enxerto ósseo. O procedimento resultou em uma complicação chamada capsulite adesiva, que travou seu ombro, acompanhado de muita dor. “Estava tendo que tomar Tramadol e, tá doido, eu não conseguia nem pensar. Me deixaram atônito, fora da realidade.”
Paciente de Cannabis
Uma escolha ingrata: dor intensa ou os efeitos colaterais do medicamento? Seja qual fosse a opção, restava pouco espaço para qualidade de vida. “Eu não queria ficar parado. Decidi, então, ir atrás do canabidiol, já que não queria ficar tomando esses outros remédios.”
Pouco tempo depois que começou com o óleo, as dores pararam de incomodar tanto. Passou a dormir melhor e, principalmente, ajudou a controlar a ansiedade e o quadro de estresse pós-traumático que enfrentava desde o acidente.
Com as dores controladas e a mente funcionando melhor, apesar de ainda estar em repouso forçado, Caio entendeu que havia chegado a hora de se dedicar de uma vez por todas à Cannabis medicinal. “Sem condições de trabalhar, com uma limitação física importante, comecei a fazer cursos. Me tratava e estudava. Ano passado houve uma explosão de cursos,congressos, e fui fazendo”, conta.
Médico prescritor
Apesar de só ter retornado ao atendimento presencial em fevereiro de 2021, logo que pode começou trabalhar por telemedicina, e assistiu os benefícios da Cannabis também em seus pacientes.
“O que muda muito é o ganho de qualidade de vida. Paciente que trabalha com pensamento, criação, se queixa muito de não conseguir produzir, imaginar, quando está tomando antidepressivo, conta. “É muito normal a queixa de estar sem sentimentos. Com o canabidiol não. Os pacientes relatam muito que tem a melhora dos sintomas depressivos, mas continua sentindo. Consegue criar, produzir.”
Dra. Tamara Passos
A Cannabis medicinal não era uma novidade para a médica Tamara Passos. Especialista em saúde da família, frequentemente acabava se deparando com pacientes com epilepsia refratária que já se tratava com a Cannabis, com “resultados impressionantes”.
Os canabinoides só entraram de vez em sua vida quando se viu do outro lado da relação médico/paciente. Diagnosticada com câncer de mama em 2014, recorreu ao canabidiol para conter os efeitos colaterais. “Eu virei paciente e vi a diferença. Sem o CBD, eu ficava destruída. Não conseguia comer nada. Dor, vômito, náusea”, lembra Passos.
“Como médica, eu então comecei a fazer testes. Uma semana eu tomava um tanto, na outra ficava sem, para notar a diferença. Foi gritante”, continuou. “Com o CBD, a quimioterapia passa muito mais tranquila. Não tem aquele mal-estar, dor de cabeça. Eu posso falar por experiência própria que, para o paciente oncológico, é outra vida.”
Benefícios da Cannabis
Não demorou para que se desse por convencida dos benefícios da Cannabis medicinal. “Não testei muito não. Depois da terceira vez, eu pensei: ‘não vou ficar sem nunca mais na minha vida. Não quero passar mal à toa.”
Agora, os benefícios que observou em sua própria experiência, repete em seus pacientes. “É muito gratificante melhorar a qualidade de vida do paciente. Conseguir dar condições para que possa passar pelo processo da doença que muitas vezes é crônica”, revela a médica. “Muitos pacientes chegam sem perspectiva. Entregar uma qualidade de vida para ele não tem preço.”
Dra. Natália Soledade
Havia algo que incomodava Natália Soledade na psiquiatra. “Cerca de 30% a 40% dos pacientes com depressão, ansiedade, insônia, não respondem ao tratamento convencional”, conta. “É uma angústia muito grande não poder ajudar um paciente. Já tentou vários tipos de medicamentos, mas ou não responde ou não se adapta aos efeitos colaterais.”
Foi em uma de suas especializações em psicofarmacologia que Soledade escutou pela primeira vez que a Cannabis medicinal poderia ser um caminho para reduzir essa angústia, mas o assunto não a cativou de imediato. “Eu tinha um preconceito no começo, mas é porque eu mesma não conhecia. A gente só dá a mão para quem a gente conhece.”
Em 2018, com a possibilidade de adquirir medicamentos à base de Cannabis legalmente no Brasil e o aumento da procura em seu consultório pelo tratamento, a psiquiatra viu que não podia ficar de fora.
Primeiras pacientes
“Minha primeira paciente com canabidiol já se tratava há muitos anos comigo. Dependente de medicamentos e um quadro grave de dores crônicas”, diz. “Cada consulta que ia, com diferentes médicos, vinha com um novo medicamento. Remédios controlados que não davam melhora alguma. Não conseguia praticamente andar.”
Até que a própria paciente, por uma notícia de jornal, soube da possibilidade do uso da Cannabis e foi conversar com a médica. “Nessa paciente que decidi tentar pela primeira vez e ela teve uma super melhora do quadro das dores. Conseguiu retirar a dependência dos medicamentos e ficou super bem. Com essa melhora, comecei a pensar em outros pacientes. Em outros casos.”
Desde então, não parou mais de estudar e se aprofundar no sistema endocanabinoide, mas foi a experiência positiva com mais e mais pacientes que deixou claro que estava no caminho certo. “Os pacientes começaram a melhorar, tendo menos efeitos colaterais. Muitos pacientes dependentes de medicamentos, com o canabidiol, começaram a desmamar. Me estimulou a cada vez mais prescrever. Se é bom para o paciente, é um remédio que serve.”
Dra. Rosana Takano Ide
A médica Rosana Takako Ide sempre foi uma pioneira. Quando decidiu por se especializar em geriatria, no início da década de 90, a especialidade mal havia chegado ao País. Fez residência em medicina preventiva, mas teve de viajar para o Japão para se aprofundar na medicina que escolhera. “Eu queria algo diferente, que fosse novo. A geriatria me encantou por ser um trabalho multidisciplinar, porque acreditava e ainda acredito nisso”, lembra a geriatra.
A Cannabis, porém, tardou quase 20 anos para entrar em sua prática médica. “Na mesma semana, diversos pacientes e amigas vieram me falar de Cannabis. Um era geriátrico, outro com dor, outra com ansiedade. Foram chegando e falando: ‘nossa, Rosana, é tão bom. Se você soubesse’. E aquilo me chamou atenção.”
Dois casos, porém, não deixaram dúvida de que essa ferramenta terapêutica poderia ser bastante útil. “O pai de uma amiga, que estava dentro de um centro geriátrico, com um grau de Alzheimer agressivo, sem comer, batendo nas enfermeiras. Eu fui avaliá-lo e dei umas gotinhas. Ele simplesmente mudou. Ficou calmo, passou a interagir, a comer. Foi incrível.”
Cannabis para Alzheimer
Em seguida, um episódio ainda mais surpreendente. “O pai de um amigo estava na UTI, perto de fazer a passagem. Os médicos tinham chamado ele para se despedir do pai, que ia morrer em horas”, conta a geriatra. “Eu fui para o hospital para vê-lo. Eu estava com o vidrinho do óleo. Eu falei, olha, posso dar umas gotas para seu pai, que se ele for, vai bem, vai mais calmo.”
Pegou uma gota, colocou na boca do paciente e aplicou um pouco também sobre a pele também e foi embora. Passou uma semana e nada do amigo entrar em contato para contar como tinha sido a passagem do pai. “Eu liguei perguntando como é que foi e ele fala: ‘você não acredita. Ele saiu daquele estado. Os médicos estão querendo levar para o quarto já, mas não sabem o que aconteceu”, relata Takako.
“A única coisa diferente foi o óleo de Cannabis que tinha dado. Mas será que é possível? Será que esse negócio é tão poderoso assim? Continuei dando o óleo, foi melhorando, teve alta. Foi morrer um ano mais tarde quando já tinha chegado a hora dele. Ai vi que esse negócio é poderoso mesmo. Deixa eu estudar isso.”
Médica prescritora
Há mais de dois anos, a geriatra é prescritora de Cannabis medicinal, mas acredita que ainda há muito para aprender. “Sou uma jovem como terapeuta canábica. Tenho prescrito para uma grande parte dos pacientes e o resultado que faz você acreditar no potencial do tratamento com Cannabis.”
“Por enquanto é só terapia canábica e eu já vejo dentro das práticas integrativas. Para mim isso é claro. Só que eu sinto que a Cannabis vai virar uma especialidade médica, onde cada especialidade pode trabalhar com a Cannabis em neuro, geriatria, psiquiatria. A Cannabis pode se tornar um grande programa médico.”
Dr. Alexandre Assuane Duarte
O gosto pelos estudos sempre fez parte da vida do médico Alexandre Assuane. Poliglota, antes mesmo de se formar percorreu diversos cantos do mundo, com cursos, estágios e trabalhos voluntários por Alemanha, Suíça, EUA e África do Sul.
Nessa trajetória, ainda em 2016, foi vendo que cada vez mais se falava sobre uma opção de tratamento que poderia ajudar os pacientes, principalmente em patologias refratárias, onde os medicamentos convencionais não atendiam.
“Eu me formei em Minas, mas durante a faculdade eu fiz intercâmbio para a África do Sul, em Miami fiz radioterapia, na Suíça medicina nuclear. Fiquei um ano na Alemanha e passei por onze especialidades diferentes e fui vendo as aplicações do CBD e da Cannabis medicinal”, afirmou.
Demanda vinda de pacientes
Ao observar que muitos pacientes buscavam a opção do tratamento com a Cannabis, decidiu se dedicar aos estudos. “Eu fui atrás dos artigos mais recentes, as publicações mais relevantes diretamente da fonte mesmo. A literatura científica de ponta, nos melhores jornais, com os melhores autores. Eu buscava sempre a informação direto da fonte.”
Assim que concluiu seus estudos, em 2020, deu início à prescrição. “Muitas doenças em que as medicações tradicionais não surtem tanto efeito, o paciente vem procurar esse medicamento e a gente recomenda também”, conta.
“Eu faço o uso compassivo da Cannabis. Por mais que não haja estudos completamente sólidos para sustentar essa terapia como primeira opção, a gente vê resultados muito positivos em diversas patologias e em diversos sintomas.”
Entre as patologias atendidas, lista o autismo, insônia, Parkinson, Alzheimer, depressão, ansiedade, bipolaridade, insônia, artrite, artrose e dependência química. Sempre como uma opção complementar ao tratamento com medicamentos alopáticos convencionais.
Dra Letícia Mayer da Rocha
A Cannabis medicinal chegou quase como uma consequência natural da trajetória da médica Letícia Mayer. “Desde minha formação eu senti falta de informação para oferecer um tratamento mais humanizado. Na faculdade, o foco é centrado na doença. Quando saí e comecei a trabalhar, vi que eu acreditava em uma medicina centrada na pessoa.”
Encontrou na especialização em medicina da família uma forma de seguir sua vocação. “ É uma das áreas mais humanizadas da medicina, a gente não faz a medicina centrada na doença”, afirma. “A gente quer que o paciente se cure de doenças que são possíveis de curar, claro. Mas o objetivo é cuidar da pessoa. Melhorar a qualidade de vida no lugar de simplesmente prolongar a vida.”
“Junto dessa perspectiva entra a Cannabis medicinal”, continuou. “É um tratamento que, até onde a gente sabe, não cura doenças, mas trata muitos sintomas. Principalmente aqueles que não respondem a outros tratamentos. Muitas doenças que não tem remédio, nem para cura nem para alívio de sintomas.”
Benefícios da Cannabis
Segundo Mayer, os benefícios da Cannabis medicinal são visíveis principalmente em seus pacientes com algum tipo de demência, Parkinson e Alzheimer. “Os medicamentos específicos das demências têm resultados muito pobres. Muita gente não responde a esse tratamento e tenta utilizar alternativas, como antipsicóticos ,antidepressivos, medicamentos para dormir”, conta.
“Todos esses têm efeitos colaterais, na maioria das vezes intoleráveis. Causam dependência, causam quedas, que é super importante da terceira idade, fora a interação entre um e outro porque na geriatria, o paciente já usou muito medicamento. A gente não tem alternativas nas demências para aliviar o sofrimento do paciente e para controlar sintomas.”
Somente a Cannabis. “Ela acaba ocupando um grande espaço pois pode diminuir os sintomas, melhorar a qualidade de vida e diminuir o sofrimento dos pacientes e suas famílias. Não existe nenhum remédio, ou combinação de remédios, que tenha conseguido esse resultado.”