O relato de Maria Carolina Boscaratto deixa evidente a necessidade de campanhas como a do Abril Azul, mês de conscientização sobre o autismo. A história de uma luta em busca de diagnóstico, tratamento e respeito aos direitos de seu filho atípico.
J., que terá o nome preservado por desejo da mãe, nasceu na 28ª semana de gestação. Muito prematuro, demandou cuidados especiais, mas logo deixou o hospital para seguir com a sua incipiente vida. A preocupação, porém, retornou ao completar seis meses de vida.
“Eu comecei a notar que ele tinha atraso no desenvolvimento. Não fazia as brincadeirinhas que as crianças de 6 meses faziam. Eu percebi que o tônus muscular dele era mais molinho.”
“Procurei alguns médicos e eles diziam que era por causa da prematuridade. Quando ele tivesse uns dois anos mais ou menos essas diferenças seriam sanadas e ele atingiria o desenvolvimento como as crianças típicas.”
A busca pelo diagnóstico
No entanto, Maria Carolina possui formação em pedagogia, já trabalhou em escola e, pela experiência, sabia que não se tratava simplesmente de um atraso de desenvolvimento.
“Quando começou a fase dele andar, com um ano mais ou menos, comecei a perceber que tinha dificuldade de se manter firme. Parecia que os ossos dele não suportavam seu peso.”
Embora a falta de tônus muscular seja um dos sintomas relacionados ao autismo atualmente, na época não era assim. “Eu comecei a fazer fisioterapia nele por conta porque eu já tinha ido em uns cinco médicos e todos falaram que era coisa da minha cabeça. Foi horrível.”
Contratou uma profissional para uma sessão por mês. “Eu fazia os exercícios em casa pois eu não tinha dinheiro para pagar toda semana. O convênio não fornecia e o SUS tem poucos profissionais.”
“Demorei 9 meses para conseguir uma consulta com o neurologista do SUS. Eles falaram ‘seu filho tem atraso no desenvolvimento, mas ele está bem de saúde. Como as vagas são muito restritas, a gente dá preferência para as crianças que tem alguma coisa severa.”
“Essa fisioterapeuta que paguei a parte foi a primeira a me dizer que não achava que eu estava errada. Que meu filho tinha alguma coisa além da prematuridade.”
“Não tô cansada, estou desesperada”
Decidiu intensificar a busca por um diagnóstico, mas só encontrou frustração. “Comecei a buscar essas clínicas multidisciplinares, eu fui em mais de 10 médicos, e todos falavam a mesma coisa: ele não tinha nada e eu era maluca. Cheguei a ouvir algumas grosserias. Ouvia do médico que eu tinha que descansar. Que eu estava cansada.”
“Comecei a estudar sobre autismo e percebia que quanto antes a intervenção fosse feita, mais chances de desenvolvimento da criança por causa da plasticidade cerebral. Quanto mais cedo é feita, mais efeito tem a terapia. Aquilo ia me matando.”
Quanto mais lia, mais tinha certeza de que tinha um filho atípico. “Entendi na hora que meu filho era autista. Meu filho é autista! Ele não responde pelo nome, não faz contato visual, se chacoalha, não dá a função pros brinquedos. Isso não é prematuridade.”
“Eu estou desesperada, pedindo ajuda, e as pessoas falando que eu estou cansada. Eu não tô cansada. Eu imagino quantas mães não passam por isso de ter certeza que seu filho tem alguma coisa e o médico diz que não tem nada. Quem é você para dizer o contrário? Você é uma histérica louca, procurando pelo em ovo, pois, se o médico diz que não tem nada, não tem nada.”
Só de olhar
Até que J. já tinha dois anos e meio de vida e sua mãe, em suas pesquisas, descobriu sobre uma abordagem chamada terapia Denver. “Essa terapeuta se propôs a fazer uma avaliação multidisciplinar do meu filho.”
“Essa terapeuta era psicopedagoga e me indicou uma neurologista. Era uma médica muito empática. Ela olhou para mim e falou: ‘eu imagino o tamanho do seu sofrimento. Só de olhar para o seu filho, eu vejo que ele é autista.”
“Foi como se eu tivesse saído de uma prisão. Eu deixei de ser a louca e virei aquela que corre atrás do prejuízo. Por mais que eu fizesse a estimulação em casa, não é igual uma equipe multidisciplinar.”
Novos desafios
A batalha da mãe, no entanto, não acabou por aí. “Começou a fazer terapia e a gente entrou em outro dilema: elas são caríssimas. Não tem gente credenciada pelo SUS. Eles oferecem terapia para crianças severas, meu filho é autista grau três, ou seja, ele é severo, mas não tem comorbidades. Não tem epilepsia.”
Conseguiu na justiça que o plano de saúde arcasse com os custos das terapias que não fossem oferecidas pela rede conveniada, mas chegou a pandemia. “Foi dramático A gente ficou quatro meses com todo mundo em casa e meu filho deu uma surtadinha e parou de dormir completamente.”
“Fomos em uma psiquiatra que receitou risperidona. Era uma situação insuportável e a terapeuta e meu marido acharam melhor a gente tentar. Foi uma experiência horrível. Em 15 dias, meu filho perdeu os movimentos. Ele tremia tanto que perdeu a força de pegar os objetos.”
Alternativa Cannabis
A mãe decidiu interromper a medicação, contra a indicação do médico, e decidiu que buscaria por alternativas.
“A gente começou a pesquisar sobre o que poderia deixar ele mais calmo. A gente suspeita que ele tenha hiperatividade, porque tinha muita dificuldade de concentração, e começamos a ler sobre Cannabis medicinal. Ninguém chegou a falar para a gente que existia essa possibilidade.”
Foi uma longa caminhada entre pesquisa, adquirir coragem para tentar, encontrar um médico prescritor e importar a medicação. “No começo, eu fiquei com medo. Não sabia se tinha feito colateral e, eu e meu ex-marido, testamos na gente e viu que não acontecia nada além de um grande relaxamento.”
Calma, sono e concentração
Chegou a hora de iniciar o tratamento de J. “Foi um divisor de águas na vida dele.”
“Nos primeiros dias, ele ficou mais calmo. Ele era uma criança que corria de um lado para o outro o tempo todo e começou a ficar mais centrado, a fazer mais contato visual.”
“Foi realmente incrível a mudança no comportamento dele. Para aprender, a criança tem que se centrar e era difícil. Ele não conseguia se sentar para fazer alguma atividade e ele começou a prestar atenção e ouvir. A terapia teve mais resultado porque ele conseguia executar os exercícios e começou a ter desenvolvimento.”
“Com 20 dias, ele estava dormindo e acho que foi o maior ganho em relação à qualidade de vida dele. Mesmo dormindo ele estava agitado. Agora não. Ele dorme igual criança e tem um sono calmo.”
“Até a estereotipia, aqueles movimentos repetitivos, diminuiu. A gente percebe que passa o dia mais tranquilo, brinca, dá função para as coisas, responde quando é chamado. Para a terapia dar certo, ele tinha que ter concentração, estar mais calmo, e foi o canabidiol que trouxe isso para ele.”
A luta por independência
Uma transformação para toda a família. “Para a gente, o que mudou foi a esperança. A gente não tinha mais esperança de que ele fosse conseguir nem se comunicar. Hoje ele já vem demonstrando que tem condição de fazer as coisas sozinho.”
“Nossa maior preocupação é deixar um filho em um mundo que não está preparado para receber a diferença, que é extremamente preconceituoso com qualquer coisa, e ele não conseguir sobreviver sozinho. Nosso maior medo é que não seja independente.”
“Essa a nossa luta. Por incrível que pareça, temos a liminar, mas ela não funciona. O plano recorre toda hora e não reembolsa. Isso acaba atrasando as terapias e o desenvolvimento dele. É uma luta que não tem fim. A gente sabe que vai ter que passar por isso para o resto da vida.”
“O que espero para o meu filho é que consiga se desenvolver e tenha a capacidade de sobreviver sozinho quando a gente não estiver mais aqui. Que ele seja feliz. A gente se sente, entre aspas, privilegiado por poder proporcionar esse tratamento para ele.”
“A gente gostaria que a grande população tivesse cada vez mais acesso às coisas que podem proporcionar uma qualidade de vida melhor. É uma luta que vai ser infinita para a gente, para nós e todos os pais, a gente acredita que está melhorando. Dos dois anos e meio para os seis anos ,que é a idade que ele está, melhorou muito.”
“A Cannabis faz bem sim, faz a diferença e não tem efeito colateral. Meu filho, pelo menos, nunca teve. Só trouxe benefício. Eu gostaria que todas as pessoas que sofressem com qualquer tipo de transtorno, tivessem acesso a tudo que fizesse bem a elas.”
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