Partido Cidadania elege PL 399/2015 – que institui o Marco Regulatório da Cannabis para fins médicos e industriais no Brasil – como pauta prioritária para fechar 2022
A menos de um mês para fechar o ano legislativo, o Presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP/AL), pediu às lideranças partidárias que escolhessem um Projeto de Lei para ser colocado em votação ainda nesse ano. De acordo com o deputado federal Daniel Coelho (Cidadania/PE), seu partido elegeu como prioridade para esse ano a aprovação do PL 399/2015, que regulamenta o cultivo da cannabis para fins médicos e industriais no Brasil.
“O Cidadania, num pedido do presidente da Câmara dos Deputados, Artur Lira, apresentou o PL 399 como matéria prioritária para o fim do ano. Claro que a decisão cabe ao presidente, não podemos deliberar sozinhos. Mas até o fim do ano vamos lutar para concluir a votação da matéria na Câmara, para que no ano que vem o assunto seja analisado pelo Senado”, prevê Coelho.
O parlamentar, que já precisou importar remédio à base de Cannabis para tratar o câncer da esposa, acredita que há maioria na Câmara dos Deputados para aprovar o texto. “É muito mais uma questão de pôr em pauta, do que necessariamente a gente convencer parlamentares. Eu acho que a maioria dos deputados já está convencida. Ao mesmo tempo, a gente tem sinalizações também do novo governo eleito, que toma posse no ano que vem, de que nós podemos ter – via regulamentação da Anvisa – a liberação do medicamento num modo diferente do que nós temos hoje. No mundo ideal, a gente tinha que ter uma nova regulamentação da Anvisa e um Projeto de Lei que desse suporte, estabelecendo as regras para cultivo. Então, são dois caminhos que estão andando em paralelo. Seria o ideal, porque a gente conseguiria dar tranquilidade jurídica, baixar preço e ter remédio acessível para toda a população”, afirma o político.
Recentemente, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) autorizou a 23ª formulação à base de Cannabis ser vendida nas farmácias. Mesmo com a abertura, menos de um terço desses produtos está disponível nas prateleiras para o paciente final. Segundo cálculo da Dra. Marianna Laíze Santos, o valor do CBD vendido nas farmácias é três vezes maior do que o preço médio da importação da molécula, seja ela isolada ou full spectrum (com todos os demais fitocanabinoides presentes na planta). “No momento em que a Anvisa autoriza e cria uma regulamentação de que o remédio está autorizado na sua plenitude para produção e cultivo, abre o espaço para que o remédio possa ser distribuído. Hoje, o CBD tem um custo altíssimo. Sem a nova legislação a gente não consegue o remédio por um preço razoável e acessível”, explica o deputado Daniel Coelho.
Descriminaliza STF
Em maio de 2017, o então PPS, atual Cidadania, entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) no Supremo Tribunal Federal (STF) pedindo que a Corte declare inconstitucional os dispositivos da Lei de Drogas (11.343/2006) que consideram crime plantar, cultivar, colher, guardar, transportar, prescrever, ministrar e adquirir Cannabis para fins terapêuticos. A ação propõe a retirada da Cannabis da lista de substâncias proibidas, assim como permite a importação de semente com adequação de plantio e posse para fins medicinais e de pesquisa.
“Desde o PPS entramos com uma ação no Supremo pedindo para que seja liberado o plantio para o uso medicinal no Brasil. Fico feliz de ver que a bancada tomou essa decisão de propor o PL 399 como pauta prioritária que pode gerar emprego, renda e imposto. Se tivéssemos mais consciência poderíamos estar na vanguarda. Nos últimos quatro anos tivemos um retrocesso enorme em pesquisa e ciência. Depois do Fernando Henrique Cardoso nenhum outro governo se preocupou com essa dimensão (legalização da Cannabis). As coisas estão avançando em todo mundo e temos a oportunidade, agora, de dar um passo adiante”, ressalta Roberto Freire, presidente do Partido Cidadania.
Para o deputado federal Lafayette de Andrada (Rep/MG) é importante regulamentar o cultivo em solo brasileiro desde que haja critério. “Sabemos que a planta tem várias utilizações industriais que são muito saudáveis para a economia e também o aspecto médico e medicinal. A regulamentação é necessária com responsabilidade. O que não queremos é a difusão do uso da maconha como psicotrópico. Mas usar a planta para fins medicinais é mais do que necessário”, defende Andrada.
O deputado Otoni de Paula (MDB/RJ) divide a mesma opinião e defende a distribuição do remédio à base de Cannabis via Sistema Único de Saúde. “Fizemos parte da Comissão que se debruçou sobre esse tema. Não há como ser contra o uso da Cannabis para fins medicinais. O problema é que aproveitaram para fazer desse tema tão urgente e tão humanitário, a politização para o plantio indiscriminanado da maconha. Somos a favor de controle. Somos a favor de que o SUS cumpra esse papel de distribuição e forneça a Cannabis aos pacientes para amenizar a dor de milhares de brasileiros”, afirma de Paula.
Afinal, o que diz o PL 399/2015?
A redação aprovada, até agora, permite o cultivo, processamento, pesquisa, armazenagem, transporte, produção, industrialização, manipulação, comercialização, importação e exportação de produtos à base de Cannabis em todo o território nacional, desde que feito por pessoa jurídica autorizada pelo poder público. A redação também prevê o cultivo por meio das chamadas “Farmácias Vivas” do Sistema Único de Saúde, que poderão dispensar produtos desde que sejam realizados testes de validação a respeito dos teores dos principais canabinoides contidos na planta, o que também vale para as associações de pacientes sem fins lucrativos.
Ao contrário dos que alegam que a regulamentação do cultivo pode favorecer o desvio de finalidade para o uso recreativo, o PL prevê condições rígidas de controle como por exemplo:
– Cota de cultivo para atender a demanda pré-contratada ou com finalidade pré-determinada, que deverá constar no requerimento de autorização para o cultivo;
– Rastreabilidade da produção (com QRcode) desde a aquisição da semente até o processamento final e o seu descarte;
– Plano de segurança, de acordo com os requisitos previstos na lei, objetivando impedir o desvio de finalidade;
– Mudas e sementes certificadas;
– Cultivo exclusivamente feito em casa de vegetação – estrutura montada para cobrir e abrigar artificialmente plantas;
– Videomonitoramento e sistema de alarme de segurança;
– Muros ou estruturas de alambrado com no mínimo dois metros de altura para impedir a visualização do plantio;
– Presença de um responsável técnico pelo cultivo;
– Instalação de cercas elétricas para impedir a entrada de pessoas não autorizadas;
– Indicação de proveniência e caracterização do quimiotipo da planta de cannabis;
Qual é a situação atual do PL 399/2015?
O PL 399/2015 foi aprovado na Comissão Especial da Câmara dos Deputados no dia 08/06/2021 com um placar apertado: 17 votos a favor e 17 contrários. O voto do relator da proposta, deputado Luciano Ducci (PSB/PR), desempatou o placar. A matéria que tramitava em caráter conclusivo, ou seja, deveria seguir direto para o Senado, ainda precisa enfrentar o debate no plenário.
O deputado Diego Garcia (Podemos/PR) – contrário ao cultivo da Cannabis em solo brasileiro – coletou 129 assinaturas para exigir que o texto também seja analisado por todos os 513 deputados no plenário. De acordo com o argumento do parlamentar na época, a discussão por ser polêmica, precisaria envolver todo o parlamento e não ficar restrita apenas à uma Comissão que não abriga nem 10% dos deputados da Casa.
Nesse momento, o recurso está à espera de uma decisão do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, para entrar na pauta. Caso o recurso seja aprovado pelo plenário da Casa, os parlamentares voltam a analisar o texto que já foi aprovado na Comissão Especial. Por outro lado, se o recurso for rejeitado, o PL 399 segue o seu rito original e caminha para a tramitação no Senado.