Foi durante a residência médica que o psiquiatra carioca Pietro Vanni se convenceu das possibilidades terapêuticas da Cannabis. Ao concluir a residência em março de 2019, na Universidade Federal do Rio de Janeiro, era evidente para ele que se tratava de uma tendência. Meses depois, viria o convite que faria a Cannabis entrar definitivamente em sua carreira.
A proposta veio de Joaquim Castro, economista e fundador da Gravital, clínica canábica do Rio de Janeiro. Ele queria que Vanni fosse diretor da clínica. Aceitou e em novembro do mesmo ano assumiu o cargo. De lá pra cá já fez alguns cursos, como o da Greenflower (fez o curso online, a empresa fica na Califórnia), e eventos de um dia. Nesse percurso, constatou que ainda há poucos caminhos disponíveis no Brasil para quem quer conhecer e entender a medicina canábica. “Por enquanto ainda é um tema novo, nunca mencionado na faculdade”.
Vanni relata que há vários amigos médicos com preconceito, sem acreditar na eficácia da Cannabis, alegando falta de estudos e comprovação científica. E emenda: “É natural que os médicos fiquem reticentes. Tem muito preconceito. É válido”.
Mas também tem vários que acabam sendo convencidos pelos resultados práticos em casos refratários. Eficácia comprovada cientificamente, somente no tratamento de esclerose múltipla e dores crônicas. Ele brinca: “mas ausência de evidência não é evidência de ausência”, e cada vez mais estudos, análises de caso e exemplos práticos estão saindo. “O mundo já está tratando a Cannabis como medicamento”.
Mesmo no cenário político atual, pautado pelo conservadorismo, Vanni diz que é uma questão de poucos anos para que mesmo a maconha seja legalizada no Brasil. “O conservadorismo pode retardar a liberação, mas não vai segurar os avanços até aqui”, profetiza.
Nos últimos meses, teve um aumento sensível na procura por tratamentos para a ansiedade proveniente da pandemia de covd-19: “O canabidiol tem efeitos promissores para a psiquiatria, porque trata a ansiedade, que é a patologia da nossa sociedade”.
Segurança no uso e sistema endocanabinoide
Vanni se preocupa com o efeito dominó dos remédios psiquiátricos tradicionais, o que leva a questionamentos como “Será que o paciente ficou diabético por causa do remédio que receitei?”. Ou a situações que o forçam a prescrever uma droga por causa de outra. “Agora vou ter que prescrever remédio pra acordar, porque o remédio pra dormir é muito forte”.
Nessas situações, a cannabis pode ser útil, pois atua diretamente no sistema endocanabinoide, que é um sistema regulatório, de equilíbrio. A cannabis atua de forma diferente dos remédios alopáticos, em paralelo. Vanni exemplifica usando a curva U invertido para a atuação do CBD: o remédio alopático aumenta os efeitos quando se aumenta a dose.
Já o CBD não, se tomar demais, deixa de fazer efeito. Portanto, é muito mais seguro. “Mal não faz”. Também ajuda a diminuir a quantidade de remédios alopáticos – Vanni aponta que tem muitos pacientes tomando dois a três remédios a menos com a adição do CBD, que diminui a dependência e tem poucos e irrelevantes efeitos colaterais.
Nos Estados Unidos, o CBD entra em categoria 5 em segurança, junto com suplementos alimentares. É dos únicos remédios realmente seguros para tratar sintomas de diversos males, por isso, Vanni acaba receitando CBD para a maioria de seus pacientes, mas sempre atento às interações medicamentosas com os alopáticos. O CBD pode aumentar seus efeitos, o que acaba levando à redução dos remédios. Ele conta que tem até um composto, o Clobazam, que, usado concomitantemente com o CBD, tem seu efeito aumentado em 10 vezes.
Já o THC tem que ser receitado com mais cuidado, porque tem 10% de risco de aumentar a psicoatividade em pacientes com surtos, por exemplo.
Na Gravital, 80% de pacientes chegam com comorbidades refratárias, ou seja, já tentaram de tudo. Dores crônicas, Parkinson, ansiedade, Alzheimer, hérnia, esclerose múltipla. Ele estima que os demais 20% sejam de pacientes buscando diminuir doses de remédios alopáticos e seus efeitos colaterais.
Vanni lembra que a cannabis não é remédio específico para nada. Trata sintomas. Ele reforça isso a seus pacientes, que frequentemente chegam esperançosos demais. “Cannabis é um remédio como qualquer outro, não faz milagres”.
Ele também atua em paralelo com os médicos alopatas que já atendem seus pacientes por décadas, e respeita o tratamento em curso. Se coloca à disposição do especialista prescritor para discussão: “Tento focar em fazer paralelo, adicionar o tratamento e ver se dá para enxugar, se der, ótimo, mas sempre com cautela”.
Talvez por isso até hoje não tenha tido embates com os médicos tradicionais. Pelo contrário, conta que teve uma psicogeriatra animada com os resultados de sua paciente septuagenária que pôde tirar o calmante de sua dieta.
“E é isso que mais estimula nesse trabalho. Os pacientes que vinham sendo tratados há 10, 20 anos sem muitos resultados, finalmente tendo uma melhora de 180 graus – é impressionante, até me emociono”, relata.
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