É importante gravar a conversa com a operadora do plano de saúde: “se, no contrato, constar a cobertura de determinada doença, ele também precisa cobrir os tratamentos prescritos pela equipe médica”, esclarece Diogo Pontes Maciel.
A regulamentação de produtos à base de maconha no Brasil foi aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em dezembro de 2019. Com esta decisão, produtos feitos com Cannabis para uso medicinal poderão ser vendidos em farmácias, mediante prescrição médica, e ficam sujeitos à fiscalização da agência.
Apesar da decisão positiva, operadoras de planos de saúde nem sempre cobrem o tratamento recomendado pelos médicos. O advogado Diogo Pontes Maciel, especialista em Direito Médico, tem sido procurado por pacientes quando há negativa dos planos no fornecimento do remédio. Morador de Curitiba, ele conta com algumas vitórias na Justiça do Paraná que que obrigam planos de saúde a fornecer a medicação com derivados da planta.
Maciel também é autor de dois Habeas Corpus que permitem o cultivo individual de Cannabis para fins medicinais. No entanto, nem todos os pacientes tem disposição para cultivar em casa ou preferem uma medicação de qualidade farmacêutica. E como possuem plano de saúde, nada mais justo do que cobrar da operadora.
“Geralmente, são pacientes idosos e crianças, que apresentam problemas neurológicos e não conseguiram a medicação”.
Conforme Diogo, os clientes pedem ajuda após a primeira negativa do plano. A dificuldade é que, muitas vezes, essa informação é passada por telefone, sem registro escrito. Por isso, é importante gravar todas as ligações.
“Como quase sempre meus clientes não têm uma gravação da negativa, eu faço uma notificação às operadoras, para ter a recusa formalizada. Se elas não resolvem administrativamente, entramos com uma ação na Justiça”.
Diogo alerta que os pacientes devem sempre observar o contrato com o plano de saúde a partir do Código de Defesa do Consumidor.
“Se, no contrato, constar a cobertura de determinada doença, ele também precisa cobrir os tratamentos prescritos pela equipe médica”, esclarece.
Muitas empresas, porém, negam esse fornecimento, já que a medicação não está no rol de procedimentos da Agência Nacional de Saúde Complementar (ANS).
O advogado explica que, independente do plano, a fundamentação da negativa de fornecimento vai ser a mesma: o rol da ANS. O rol é exemplificativo, não se limita ao que está lá. É apenas a garantia mínima da cobertura tanto do remédio quanto de terapias necessárias para melhora do paciente, por exemplo.
O canabidiol é receitado para tratamento de doenças como Mal de Parkinson, Alzheimer, autismo, dor crônica, esclerose múltipla, Síndrome de Tourette e Dravet, entre outras.
A nova regulamentação por parte da Anvisa não altera o dever de cobertura do tratamento pelos planos de saúde. Se o medicamento à base de canabidiol tem se mostrado efetivo no controle da doença, ainda mais quando o paciente já fez uso de outras opções disponíveis no mercado, o convênio é obrigado a fornecer os produtos que contenham as substâncias canabidiol (CBD) e tetra-hidronacabidiol (THC) em sua formulação.
“Quando converso com meus clientes, percebo que, além de neurologistas, psiquiatras e ortopedistas também estão se abrindo para o uso do canabidiol em diversos tratamentos. O preconceito faz com que muitos médicos ainda só recorram à substância, depois que vários outros remédios não funcionaram, o que acaba resultando em efeitos colaterais muito fortes aos pacientes”, explica Diogo.
“É diferente do CBD, que tem baixos efeitos colaterais”, comenta Diogo, que preferiu não abordar nenhum caso específico de seus clientes, para preservá-los de eventual preconceito.
Apesar das dificuldades, o advogado acredita estar havendo uma abertura por parte do Judiciário ao tema: “por se tratar de situações de urgência, que envolvem saúde, temos conseguido pareceres favoráveis entre três e cinco dias. Também considero importante essa regulamentação da Anvisa, desde que o mercado possibilite preços acessíveis aos pacientes”.
O que dizem os planos de saúde
Em nota, a Associação Brasileira de Planos de Saúde informou que as operadoras de planos de saúde prestam todo e qualquer atendimento do Rol de Eventos e Procedimentos em Saúde da ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar. A observância do rol é de extrema importância, pois a lista serve como diretriz para a precificação dos planos de saúde por meio de cálculos atuariais.
Afirma ainda que se todos os procedimentos médicos e tecnologias existentes – não importando o preço, a procedência ou a eficácia – tivessem a cobertura obrigatória pelos planos de saúde, o preço do convênio médico seria incalculável. Sobre a temática, a associação afirma ser importante, diz que desafia a sustentabilidade do setor e a capacidade de financiamento da sociedade, empresas e famílias.
Acrescenta ainda que para tentar conter a judicialização desnecessária, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) tem se empenhado no estabelecimento de núcleos de apoios técnicos nos principais tribunais do País, os chamados NAT-JUS, onde os magistrados podem solicitar apoio a um corpo clínico capacitado para elucidar dúvidas de cunho técnico em saúde, seja em âmbito público ou privado.
A nota termina afirmando que: “segundo os últimos dados disponibilizados pela ANS, a judicialização na saúde suplementar consumiu R$ 2 bilhões dos recursos disponíveis em planos de saúde em 2018, e este volume vem crescendo no decorrer dos anos”.