“As pessoas não podem ficar prejudicadas”, diz Ministro da Saúde sobre Resolução do CFM que limita a prescrição de medicamentos à base de Cannabis no Brasil.
A declaração do Ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, foi feita hoje durante uma coletiva da pasta sobre uma ação contra poliomielite e multivacinação. Ao ser questionado por um jornalista sobre a Resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) nº 2.324/2022 – que lista uma série de restrições à prescrição de produtos à base de Cannabis por médicos brasileiros – Queiroga falou que apesar de não conhecer por inteiro o teor da normativa, as contestações já começaram a chegar. “Eu ainda não li a resolução no seu inteiro teor, mas já me chegaram reclamações acerca dessa resolução justamente por esses pontos que você coloca (limitação de prescrição para 2 tipos de epilepsia e esclerose tuberosa) com indicação desses princípios ativos para além do que está posto naquela resolução”, disse o Ministro da Saúde.
Marcelo Queiroga afirmou que vai conversar com o presidente do CFM, Dr. Hiran Gallo para se inteirar melhor da Resolução e dos argumentos que embasaram a normativa.
“Naturalmente, o Conselho Federal de Medicina deve ter feito o devido impacto regulatório dessa medida e vamos chegar a um denominador comum. Enfim, as pessoas não podem ficar prejudicadas. No Brasil, hoje, a judicialização da saúde é algo muito presente, muito marcante. Então, se não tivermos normas que estejam muito apropriadas acaba judicializando e mesmo com a melhor das intenções, você acaba pervertendo ou distorcendo a aplicação de políticas públicas eficientes”, reconheceu Queiroga.
Entre 2015 e abril de 2022, a Coordenação-Geral de Gestão de Demandas Judiciais em Saúde do Ministério da Saúde atendeu a 128 demandas de ações judiciais de pacientes só do Distrito Federal, que solicitaram medicamentos à base de Cannabis por meio do Sistema Único de Saúde (SUS). Os dados, conseguidos com exclusividade pela reportagem – por meio da Lei de Acesso à Informação (Lei 12.527/2011) – mostram que ao longo desse período 14 empresas estrangeiras e uma nacional forneceram produtos com canabinoides (canabidiol e tetrahidrocanabinol), em diferentes concentrações, formatos e valores distintos aos pacientes que buscaram a justiça para obter o medicamento. Somando as 128 demandas judicializadas, foram entregues 5.468 unidades no período. Ao todo, o Sistema Único de Saúde comprou R$ 3.155.716,00 reais em medicamentos só para atender aos pacientes do Distrito Federal. É como se o Estado tivesse gastado, em média, R$ 24.654, 00 por demanda judicial.
O Ministro da Saúde agora deve constituir um grupo de trabalho para estudar de que forma a Resolução do CFM vai impactar na distribuição de medicamentos à base de Cannabis pelo Sistema Único de Saúde. “O Conselho Federal de Medicina é o órgão de natureza autárquica que regula e fiscaliza o exercício profissional, portanto tem prerrogativas para editar essas resoluções disciplinando o ato médico”, defendeu Queiroga. De acordo com dados da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, há mais de 100 mil pacientes com autorização para importação de extratos vegetais da Cannabis. E segundo projeções da empresa de dados Kaya Mind, até maio do ano que vem serão 200 mil brasileiros com autorização para importar a Cannabis Medicinal e todas as suas moléculas.
O texto aprovado pela Sessão Plenária do CFM, no dia 11 de outubro, limita a prescrição de canabidiol (CBD) – uma das moléculas presentes na Cannabis – exclusivamente para o tratamento de epilepsias refratárias às terapias convencionais na Síndrome de Dravet e Lennox-Gastaut e no Complexo de Esclerose Tuberosa. A nova redação também veda ao médico a prescrição da Cannabis in natura para uso medicinal, assim como quaisquer outros derivados que não o canabidiol, salvo relatados em estudos clínicos autorizados pelo Sistema da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) e pelos Comitês de Ética em Pesquisa (CEP) – órgãos vinculados ao Ministério da Saúde. A Resolução ainda determina que os pacientes submetidos ao tratamento com o CBD, ou seus responsáveis legais, sejam esclarecidos sobre os riscos, benefícios, e assinem um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido antes de iniciar a administração do produto. Por outro lado, a Resolução do CFM não explica como deverão proceder os pacientes que já estão em tratamento exitoso com o extrato da planta.