Nesta terça e quarta-feira (8 e 9/12), o Ministério da Saúde realiza a 93ª reunião da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias do SUS, a Conitec. Entre as pautas do encontro, estava a incorporação ao Sistema Único de Saúde do óleo Canabidiol 200 mg/ml da farmacêutica paranaense Prati-Donaduzzi. O produto é destinado para tratamento de epilepsias refratárias de crianças e adolescentes e custa R$ 2,5 mil.
A incorporação foi uma sugestão da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde. Contudo, o governo retirou o assunto da pauta, às vésperas do evento.
Em nota enviada ao portal Cannabis & Saúde, o Ministério da Saúde informou que a apreciação inicial da demanda para incorporação do canabidiol “foi adiada porque o relatório técnico para avaliação da pauta não foi concluído em tempo hábil. O tema deverá ser pautado na 94ª Reunião da Comissão, a ser realizada em fevereiro.“
A incorporação do canabidiol no SUS é uma iniciativa do governo federal como resposta ao PL 399/15, que legaliza o cultivo de Cannabis para fins medicinais e industriais no Brasil. O texto está no aguardo do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e conforme expectativa do presidente da Comissão da Cannabis, Paulo Teixeira (PT-SP), o projeto pode ser votado ainda neste ano.
Mas o governo é contra o plantio de Cannabis em solo nacional. O ministro da Justiça chegou a encaminhar uma moção de repúdio ao PL 399 aos deputados federais. A incorporação do canabidiol pelo SUS seria uma alternativa para dar acesso aos pacientes. Contudo, a medida não foi bem vista por associações de pacientes nem pela própria indústria.
A Associação Brasileira da Indústria de Insumos Farmacêuticos (Abiquifi), que representa mais de 40 empresas, oito delas envolvidas no setor de Cannabis, encaminhou recentemente uma solicitação ao Ministério da Saúde para que a incorporação de canabidiol no SUS não estivesse atrelada a uma concentração específica.
“Partindo do princípio de que o canabidiol é um princípio ativo em que se observa variação de sua concentração a depender da necessidade terapêutica do paciente, e que existem outros Produtos de Cannabis em fase de obtenção da autorização sanitária junto à Anvisa, solicitamos que seja considerada a inclusão somente do princípio ativo não atrelado à nenhuma concentração específica.
Para a Abiquifi, uma maior oferta garante mais acesso à população e economia nos produtos sendo oferecidos. ONGs também lamentam que não haja precisão de incorporar produtos com concentrações de THC, essencial em diversos tratamentos.
Na semana passada, a Conitec confirmou a desistência de incorporar o medicamento Mevatyl, um fitofármaco de CBD e THC indicado para controle da esclerose múltipla e que custa R$ 2,9 mil. Contudo, ao contrário do Mevatyl, que possui registro de medicamento na Anvisa, o CBD da Prati-Donaduzzi não é considerado um medicamento e possui somente uma autorização sanitária (AS) pela agência. Logo, não poderia ser incorporado, como nos explicou a advogada especialista em direito à saúde, Ana Izabel de Holanda.
Visão diferente tem a advogada Maria José Spectrum, consultora especializada em saúde pública e ex-diretora de Relações Institucionais da Spectrum Therapeutics.
“A RDC 327/19 da Anvisa é uma ato infra legal da autoridade sanitária, que mesmo sendo precário autoriza a comercialização dos produtos após a autorização sanitária. Nesse sentido, não há como afirmar que o produto não está apto para a incorporação se a comercialização dele está autorizada”, argumentou.
“O que causa estranheza é o fato do indeferimento do Mevaryl por limitação científica, pois o mesmo possuir registro sanitários e as bases científicas foram aprovadas pela Anvisa. No caso de produtos com AS, a comprovação científica se da apenas por revisão bibliográfica, bem mais frágil e superficial que os estudos clínicos da anterior”, questionou.
Em agosto, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) determinou que o governo federal incluísse medicamentos à base de CBD e THC na lista de fármacos oferecidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS). A decisão, no entanto, prevê apenas remédios registrados pela Anvisa.
O Ministério da Saúde tem se aproximado da farmacêutica paranaense. Em outubro, fechou um convênio de transferência de tecnologia com a empresa, sob sigilo industrial. O contrato não foi antecedido de edital, o que motivou um requerimento feito pelo relator da Comissão Especial da Cannabis, o deputado Luciano Ducci (PSB-PR), solicitando explicações sobre o convênio.
A Prati-Donaduzzi não está se manifestando publicamente sobre o assunto.