Depois que Dustin Sulak prescreveu Cannabis algumas vezes, a notícia se espalhou. Centenas de pessoas passaram a lhe procurar em seu consultório. Era o ano de 2009 e havia poucos médicos nos EUA trabalhando com o medicamento. Os pacientes pediam porque conheciam o efeito da substância, por conta do uso ilegal, mas queriam entrar na legalidade. O osteopata ficou surpreso com a demanda. Sulak não tinha planejado ou previsto este efeito.
Não que a Cannabis fosse um tema estranho para ele. Ativista pró legalização do uso adulto de maconha desde os 18 anos, chegou a ser preso por posse aos 19 anos. Apesar do revés, não desistiu do ativismo, que tinha o objetivo de educar as pessoas sobre segurança, benefícios do uso e a legalização. Produzia panfletos e falava em eventos, sempre com foco na injustiça social que a proibição causava.
Apesar do interesse, o tema não o acompanhou na medicina, quando entrou na faculdade. Escolheu ciência da nutrição, por considerar que poucos médicos têm informação a respeito. Ainda era pouco. Cursou biologia e trilhou seu caminho pela osteopatia – gostava da abordagem da promoção da saúde em oposição ao modelo alopático, que trabalha mais o controle das doenças. Segundo ele, fora dos EUA, os osteopatas são tidos como quiropráticos e não médicos licenciados. Mas essa especialidade, criada pelo americano Andrew Taylor Still, no século XIX, é devidamente licenciada nos EUA e conta com treinamento sobre como usar as mãos para obter a cura, além do curso tradicional de medicina.
Ele queria se tornar um médico, mas são se animava com a medicina tradicional. Ao escolher a universidade, Sulak conta que era como se ele estivesse entrevistando a Midwestern University e não o contrário. “Eu queria aprender mais sobre medicina integrativa”, diz.
Mentorias preciosas
Em 2004, foi a uma conferência de osteopatia. Assim como os médicos no Brasil, também nunca tinha ouvido falar do sistema endocanabinoide na faculdade e ficou fascinado. O professor e botânico John McPartland fez uma explanação sobre os níveis de anandamida (substância endógena de ação similar ao THC) antes e depois da manipulação osteopática. No quarto ano da universidade, Sulak fez sua prática clínica e aprendeu mais sobre o sistema endocanabinoide.
Além da influência de McPartland, Sulak se alegra por também ter contado com a mentoria de uma referência mundial em Cannabis: o neurologista e pesquisador Ethan Russo, que já trabalhava no tema há uma década. Nos anos seguintes, passou a se encontrar com ele nos EUA e em conferências pelo mundo. Sulak considera esse contato crucial para seu aprendizado, em uma relação de “mentoria e amizade”. “Ele é fonte de informação e muito generoso, muitos médicos ligam para ele para receber apoio e conhecimento”, diz.
A consulta do expert
Sulak avalia que 95% de seus pacientes já chegam querendo o tratamento com Cannabis em sua clínica no Maine. Logo na primeira consulta ele já trata com osteopatia e reiki.
Outra especialidade do médico é a hipnoterapia, embora a use menos. Ele lembra que seu processo de conversar com o paciente já é, em si, uma forma de hipnose consciente, tamanha a interação que sempre busca. Sulak explica que a hipnoterapia funciona como indução, a forma de se passar de um estado normal de consciência para um estado diferente. Ele trabalha os pensamentos subconscientes e comportamentais das pessoas. “É um tratamento físico e mental”, diz, salientando que a Cannabis aumenta a capacidade de mudança nos pacientes.
Por isso, em suas consultas, pergunta aos pacientes: “Se você pudesse tirar alguma coisa de sua vida, o que seria? Imagine-se muito mais saudável em alguns meses, imagine o que será diferente do que está acontecendo agora”. Ele usa estas questões para levar a pessoa a pensar e criar objetivos concretos, já na primeira visita. As respostas são bastante pessoais.
Depois ele pede um histórico, para saber se já usaram Cannabis e quais foram os efeitos. Então, segue com exames físicos e osteopáticos. O paciente sai com um plano: qual tipo de Cannabis deve usar, dosagem, frequência e o que pode esperar. O retorno pode variar de um a três meses, mas, por ser um tratamento personalizado, varia entre retorno urgente ou apenas um telefonema.
Milhares de bons resultados
Com um sorriso no rosto, Sulak define como incríveis os resultados dos tratamentos. São apenas 5% dos pacientes sem qualquer benefício. Os outros 95% têm alguma melhora, que pode ser pequena, como apenas dormir melhor, ou mais profundamente. Já ouviu de pacientes frases como “isso é um milagre, você me deu a minha vida de volta”, conta.
Segundo o médico, outra forma de medir benefícios é a diminuição ou descontinuação dos remédios tradicionais que já tomam. Pelo menos 90% dos seus pacientes usam a Cannabis como substituto para algum remédio. Dr. Justin Sulak lamenta: “Não é comum desmamar tudo porque nos EUA tem muita prescrição”. O que se vê é a grande substituição de opioides, benzodiazepínicos, remédios para dormir, antidepressivos, antiepilépticos e neurolépticos .
Os pacientes vêm para tratar as mais variadas doenças com Cannabis: dor crônica, estresse pós-traumático (PTSD), ansiedade, câncer, distúrbios do sono, epilepsia e outros transtornos neurológicos como problemas na medula espinhal, doenças genéticas, esclerose múltipla, esclerose lateral amiotrófica, doença de Lyme e dores crônicas.
Mas a interação com os especialistas em neurologia, neuropediatria e oncologia é muitas vezes indireta. Se os pacientes querem Cannabis, os profissionais os referenciam a Sulak. Desta forma, ele conta com esses especialistas parceiros para ajudar em seu atendimento, e os especialistas contam com ele para dar o tratamento com Cannabis.
Encolhimento de oferta medicinal nos EUA
No Maine, onde atende, Sulak percebe um movimento que acredita acontecer nos EUA como um todo. Apesar da alta procura pelos tratamentos com Cannabis medicinal, muitos médicos que prescrevem não fazem uma consulta, não pedem exames físicos. “Você dá o dinheiro e eles dão a receita”, conta. O que Sulak chama de pseudo mercado recreacional vem crescendo nos EUA, o que está diminui a oferta de produtos medicinais de qualidade no país.
Num momento em que finalmente existem pesquisas e educação de qualidade sobre medicina canabinoide, os pacientes têm poucos produtos que atendam às recomendações médicas. Em muitos estados americanos, o acesso ainda é muito difícil e os produtos são pouco regulados, causando problemas de qualidade como fórmulas não condizentes com a bula e contaminação com pesticidas ou mofo.
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Sulak denuncia que muitas empresas estão cortando caminho e não têm interesse em servir os pacientes, visando apenas o lucro. É esse foco no lucro que faz com que as companhias, assim que têm a oportunidade, saiam do mercado medicinal e partam para o mercado recreacional, mais lucrativo. Isso faz com que os médicos se preocupem se o paciente vai ter disponibilidade dos produtos para que tenham resultados.
Sulak acredita que, apesar de estar em contração, o mercado de Cannabis medicinal nos EUA sofrerá nova expansão, desta vez menor, mas mais específica. Com esta contração, os pacientes estão perdendo o acesso e que deveriam ter o direito de plantar o próprio remédio. Nos EUA há vários estados que não permitem o plantio e obrigam pacientes a comprar de grandes corporações, nem sempre orientadas para a medicina. “A pessoa pode ser presa por plantar. Precisávamos legalizar a Cannabis medicinal e descriminalizar a recreacional”, diz, arrematando que é importante remover a penalização para uma pessoa que esteja carregando só o suficiente para uso próprio.
Preparando o futuro
Com este cenário, Sulak afirma que sua prática integrativa é uma raridade nos EUA, e seu consultório está sempre cheio. Com uma equipe com outros quatro profissionais, eles atendem uma média de nove mil pacientes por ano e, nos últimos dez, já atenderam dezoito mil pacientes. Segundo ele, alguns especialistas preferem referenciar pacientes a descobrir como receitar. “Eles têm sua própria especialidade e não têm o paradigma diferente que o tratamento exige”. Outros médicos têm medo de prescrever, o que obriga os pacientes a procurarem Sulak para que ele oriente seus médicos sobre como fazê-lo.
Por isso, ele percorre os EUA e o mundo para ajudar a preparar outros médicos. Nos EUA, sonha que cada estado tenha mais médicos “campeões da Cannabis”, como chama, para ajudá-lo na tarefa de educar. Ele cita Paula Dell Stella, que também vai participar do Medical Cannabis Summit, como uma referência brasileira em medicina canabinóide. Há um ano e meio preparando um livro sobre Cannabis medicinal para médicos, Sulak equilibra a prática clínica, a administração do negócio e as participações em congressos pelos EUA e pelo mundo.
No Medical Cannabis Summit, ele vai falar sobre medicina integrativa, promoção de saúde e prevenção de doenças. Para Dustin Sulak, a importância de eventos como esse é a educação: “A educação é como mudamos o mundo. Leva tempo e repetição, e é o principal método de mudança”.
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