Sob pena de multa diária de R$ 1 mil, magistrada afirma que o Instagram não apresentou justificativa para banir conta de empresária da plataforma
Impotência e revolta. Esses sentimentos resumem a sensação da empresária Thaise Alvarez que há 20 dias teve a conta pessoal banida do Instagram sem qualquer motivo ou explicação. Apesar de a executiva da Alma Lab – importadora de produtos à base de Cannabis – trabalhar com o uso terapêutico da planta, ela garante que jamais publicou qualquer foto ou vídeo que pudesse remeter ao uso adulto da erva. “Tenho certeza de que não publiquei nada que vai contra as regras da plataforma. Quando publicava algo sobre Cannabis era de eventos médicos e palestras”, relembra Alvarez.
Depois de buscar todos os meios administrativos possíveis, a empresária se deu conta de que precisaria recorrer à justiça para recuperar mais de 10 anos de história, fotos e contatos perdidos. E a decisão foi favorável. Em 24 horas, a juíza de Direito substituta, Lilian Resende Castanho Schelbauer, da 24ª vara Cível de Curitiba/PR, entendeu – em caráter liminar – que não houve motivo para justificar a suspensão do perfil e determinou a reativação da conta sob pena de multa diária de R$ 1 mil, com limite máximo de R$ 50 mil.
Ao analisar o pedido, a juíza afirmou que existe a probabilidade de o direito da executiva ter sido violado, já que inexiste provas nos autos acerca do motivo que ensejou a suspensão/bloqueio do perfil da autora na rede social Instagram. Para a magistrada, o perigo de dano é visível uma vez que a autora também utiliza sua rede social para o desenvolvimento de sua atividade de empresária. O advogado da ação Guilherme Alberge, especializado em responsabilidade civil, explica que conseguiu demonstrar que, sem acesso ao Instagram, a cliente estava perdendo dinheiro e oportunidades de negócios. “Reunimos dados bancários e movimentações financeiras para comprovar o dano material e lucro cessante. Como ela é a única sócia da empresa também utilizava o perfil pessoal para fazer negócios”, explica o jurista.
De acordo com Alberge, assim como no Direito Penal, há de se apontar com clareza as supostas infrações às regras da plataforma antes de impor sanções.
“Eu li os termos de uso do Instagram e são completamente genéricos. A plataforma afirma que a minha cliente violou os termos de uso. Mas qual cláusula? Qual publicação? Que dia e hora? Sem essa resposta, não é possível construir uma defesa satisfatória”, lamenta Alberge.
Para o advogado, o algoritmo do Instagram não tem precisão quando utiliza apenas palavras-chave para banir as contas dos usuários. “Outro dia eu publiquei uma foto nadando e escrevi: dose diária de endorfina. Na hora, o Instagram sinalizou que a publicação se tratava de Covid ou vacina, porque eu escrevi ‘dose’. Um exemplo claro de falha no algoritmo”, conclui Guilherme.
Marco Civil da Internet e amparo legal
A boa notícia é que os usuários da internet não estão desamparados. O art. 20 do Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/2014) é claro quando afirma que: “ Sempre que tiver informações de contato do usuário diretamente responsável pelo conteúdo a que se refere o art. 19, caberá ao provedor de aplicações de internet comunicar-lhe os motivos e informações relativos à indisponibilização de conteúdo, com informações que permitam o contraditório e a ampla defesa em juízo, salvo expressa previsão legal ou expressa determinação judicial fundamentada em contrário”.
De acordo com o advogado Alberge, o Instagram não descumpre apenas a Lei que regulamenta as regras na Internet, como também não respeita as relações previstas no Código de Defesa do Consumidor. “O Instagram não é pago, mas a própria plataforma se auto intitula como fornecedora de serviços. Ou seja, o usuário se enquadra no conceito de consumidor. O inciso 8º do Código de Direito do Consumidor garante a inversão do ônus da prova. Como que vou provar se o perfil não violou as regras, se ele foi derrubado e não é possível mais acessar o conteúdo? Cabe ao Instagram mostrar que a suspensão ou banimento foi feito de forma legítima. Do contrário, não há respaldo comprobatório”, ensina Guilherme.
Entenda o caso
Thaise Alvarez conta que no dia 30/11, primeiramente, recebeu uma mensagem do Instagram dizendo que a conta havia sido suspensa por atividade incomum e pediram a confirmação da identidade. “Me pediram para eu escrever num papel meu nome de usuária, um código que me passaram e que fizesse uma foto e enviasse para eles. Só que três dias depois, mesmo depois de confirmar a minha identidade, o perfil acabou sendo banido do aplicativo sob a alegação de que eu havia descumprido as normas comunitárias da rede e que a decisão não poderia ser revertida. Fiquei muito indignada. O Instagram não conseguiu confirmar a minha identidade? Não houve chance de defesa! Até agora não sei qual publicação, supostamente, poderia ter violado as regras”, reclama a executiva.
Ganha, mais nem sempre leva
Ainda que a justiça tenha determinado ao Instagram reativação da conta nesse caso em específico, em outros processos semelhantes a plataforma demonstra que prefere arcar com o valor da multa ao devolver o perfil ao usuário. “A alegação é de que é tecnicamente impossível reativar um perfil inativo ou banido. Se a multa não for elevada, o Instagram não cumpre liminar. Um caso emblemático chegou ao STJ, que entendeu ser legítima a multa de R$ 254 mil ao Facebook por violação grave e arbitrária. Nesse caso o Facebbok/Instagram pagou”, lembra Alberge.
Relembre o caso
Em setembro de 2020, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que condenou a Facebook a pagar multa acumulada no valor de R$ 254 mil por causa da demora no cumprimento da ordem judicial para reativação de um perfil no Instagram. Como a rede social não apresentou nenhuma justificativa aceitável para a demora no cumprimento da ordem da justiça paulista, o relator ministro Marco Buzzi, entendeu que se tratava de descaso com a justiça brasileira. “Desde a origem, a conduta processual da recorrente sinaliza profundo descaso em relação ao presente feito, tal como demonstra a apresentação de contestação pro forma, sem impugnações específicas, assim como a desídia no cumprimento da ordem judicial mesmo após a prolação de sentença condenatória”.
O que diz o Instagram?
A assessoria de imprensa do Instagram afirmou que não comentaria esse tipo de problema e que a empresa não teria nenhum representante para gravar entrevista. Sobre o passo a passo solicitado para resolver problemas de bloqueio, restrição ou suspensão da conta, o Instagram enviou a seguinte mensagem:
Caso um usuário tenha um conteúdo ou conta removidos pelo Instagram e não concorde com a decisão, é possível apelar e solicitar uma nova revisão. Repetidas violações podem levar à remoção de uma conta e, se um usuário achar que sua conta foi desativada por engano, também é possível pedir uma revisão da decisão (https://www.facebook.com/help/instagram/366993040048856?helpref=related), clicando aqui: https://help.instagram.com/contact/606967319425038.
Os pedidos de revisão são analisados por nossas equipes e, se cometermos um erro, o conteúdo ou conta será restaurado e o usuário notificado.
É possível acompanhar quantos conteúdos já publicados violam as Diretrizes da Comunidade por meio do recurso Status da Conta (Configurações > Conta > Status da Conta), por onde também é possível apelar de uma decisão do Instagram.
Muito embora haja essa orientação para recuperação de contas perdidas, usuários da rede social afirmam que a empresa simplesmente ignora as solicitações e fornece qualquer apoio ou atendimento ao usuário.
Sobre essa reclamação, o Instagram não respondeu à reportagem.
Orientação para usuários de redes sociais que sofreram sanções:
– Reunir a maior quantidade possível de provas;
– Seguir o passo a passo administrativa e guardar todo o histórico de comunicação;
– Descrição detalhada sobre a suspensão, bloqueio ou restrição;
– Reunir o histórico de faturamento da empresa e comprovantes bancários para comprovando danos materiais comprovados, lucros cessantes e danos materiais;
– Após a revisão e a negativa, o caminho é a ação judicial;