Em recente evento realizado na Comissão de Saúde na Câmara dos Deputados, entre tantos debates para garantia de acesso ao tratamento do câncer no Brasil, o painel que mais me chamou a atenção foi “A Judicialização na Oncologia”. As falas do representante do CNJ – FONAJUS (Conselho Nacional de Justiça – Fórum Nacional do Judiciário para a Saúde) e do Procurador Federal – MPF (Ministério Público Federal) realmente trouxeram reflexões importantes para esse fenômeno na área da Saúde.
É fato notório que o CNJ e o Ministério da Saúde ao longo de anos adota medidas que contribuem para redução da Judicialização. Não obstante, o e-NatJus é uma ferramenta que auxilia os Juízes para as melhores decisões. O CNJ disponibiliza na web Notas Técnicas sobre um determinado produto de caráter orientativo, sem avaliação de farmacoeconomia e elaboradas por profissionais da área da Saúde que estão alocados em Universidades. Dos 11 medicamentos mais judicializados, a maioria das Notas Técnicas são para 5 medicamentos oncológicos no período de 2019 a 2022.
A surpresa ficou para 2023, quando a judicialização da Cannabis (CBD e THC) passou a ocupar o 1º lugar dentre as demandas judiciais
Importante ressaltar que no Tribunal Regional Federal da 2.ª Região a Cannabis já ocupa o segundo lugar na Judicialização. Esse é o caminho dos que pretendem uma solução técnica e social para esta questão, mas que se repete e repete…
Pois bem, o CNJ anunciou as seguintes medidas para avançarem no desempenho efetivo nas atividades dos Operadores de Direito:
- Publicação da Política Nacional do Poder Judiciário que conterá novos mecanismos para a Judicialização – em especial da oncologia, bem como o monitoramento do fluxo do cumprimento da Decisão proferida, não sendo favoráveis os depósitos em conta;
- Gestão de dados, melhoria nas informações de número das demandas para cada tipo de medicamento, possibilitando a informação real e eficiente para o Estado de cada localidade;
- Empoderamento do e-NatJus, ampliando a participação de médicos e farmacêuticos para melhor desempenho nas Notas Técnicas emitidas;
- Capacitação de Juízes no tema da Saúde, com objetivo de terem um alcance ampliado do impacto que a Decisão pode trazer no financiamento da estrutura organizacional da Saúde, sem perder o controle da garantia de acesso.
Do ponto de vista da Procuradoria da República – MPF, a Judicialização se origina em um fato não resolvido. Também destacou que 50% dos pacientes oncológicos não gozam do cumprimento legal de seu direito determinado na Lei dos 60 dias para seu atendimento. No caso de medicamentos já incorporados, igualmente 50% não são destinados a quem precisa. O custeio da Oncologia ocorre via APAC (Autorização para Procedimentos de Alta Complexidade), onde o recurso para a assistência e tratamento medicamentoso já possuem valores definidos para qualquer medicamento prescrito, porém na prática essa não é a realidade. A compra de medicamentos é centralizada em 13 medicamentos, sendo que 7 desses não são possíveis de serem pagos pela APAC e um deles custa 5 vezes mais o seu valor total. Nesse cenário, o paciente não tem acesso nem pela compra centralizada, nem aos medicamentos incorporados e muito menos via a APAC.
Os desafios começam na indicação/prescrição off label: como lidar com tanta indicação diversa? Como tratar de medicamentos incorporados para uma determinada doença e também para o tratamento oncológico?
Destaca-se que a otimização entre os Poderes para evitar retrabalho é fundamental para resolver uma só demanda. Sabendo de um orçamento finito e que não é possível deixar de atender o coletivo, resta os Mandatos Coletivos, mas qual doença pode esperar?
Por fim, a Procuradoria da República – MPF entende que a CONITEC (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias) deveria ser uma Agência Reguladora com maior independência. Sobre essa questão, é importante ressaltar que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária já autorizou de 2015 a maio de 2023 cerca de 208.220 mil produtos de Cannabis para uso medicinal.
O objetivo aqui é refletirmos como a sociedade organizada pode ser eficiente na contribuição de sugestões para a gestão desse cenário incerto na área da Saúde. Nesse sentido, alguns pontos se destacam: ainda está em vigência uma gestão ineficiente dos recursos da Saúde para a assistência farmacêutica, na qual não se leva em conta, por exemplo, diferenças sociais entre os pacientes; há pouco acesso a informações de qualidade sobre medicamentos e tratamentos; há um déficit na incorporação do que realmente funciona e o limite de recurso só tende a aumentar e, por fim, é notório que a Cannabis medicinal percorre o mesmo trajeto de medicamentos de alto custo.
É preciso lutar para a melhoria dos serviços de Saúde de maneira coletiva, o que certamente contribuiria para a redução da Judicialização e, portanto, para o aumento da eficiência da gestão dos recursos da Saúde. Por exemplo, é necessário privilegiar a assistência e não o custeio de medicamentos, o que ampliaria o atendimento integral e a satisfação dos usuários dos serviços públicos de Saúde, fortalecendo o sistema minimamente organizado do SUS.
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