A 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou na semana passada que a importação de poucas sementes de maconha não é suficiente para enquadrar o autor da conduta nos crimes previstos na Lei de Drogas. Ao reconhecer a atipicidade da conduta, os juízes determinaram o trancamento da ação penal.
Com a decisão, tomada por maioria de votos, a seção resolveu divergência entre a 6ª Turma (que já tinha essa orientação), e a 5ª Turma, para a qual deve ser reconhecida a tipicidade da conduta de importação de sementes de maconha, por se amoldar no Artigo 33 da Lei de Drogas (Lei 11.343/2006).
“As condutas delituosas estão adstritas (ligadas) a ações voltadas ao consumo de droga e aos núcleos verbais de semear, cultivar ou colher plantas destinadas à preparação de pequena quantidade de droga, também para consumo pessoal. Sob essa ótica, o ato de importar pequena quantidade de semente configuraria, em tese, mero ato preparatório para o crime do artigo 28, parágrafo 1º – impunível, segundo nosso ordenamento jurídico”, explicou a ministra Laurita Vaz, referindo-se à Lei de Drogas.
A defesa do réu entrou com os embargos de divergência por haver dissenso entre as turmas de direito penal do STJ quanto à tipicidade ou não da conduta de importar sementes de maconha em pequena quantidade.
Conceito de droga
Relatora dos embargos, Laurita Vaz destacou que a Sexta Turma tem reconhecido a atipicidade em razão da inexistência de previsão legal que expressamente criminalize, entre as condutas do artigo 28 da Lei de Drogas, a importação de pequena quantidade de matéria-prima ou insumo destinado à preparação de droga para consumo pessoal.
A ministra lembrou que o conceito de “droga”, para fins penais, é aquele estabelecido no Artigo 1º, parágrafo único, combinado com o Artigo 66, ambos da Lei 11.343/2006 – norma penal complementada pela Portaria 344/88 da Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde. De acordo com a magistrada, a portaria não inclui a semente de maconha na lista de produtos que podem ser considerados drogas ilícitas.
Segundo Laurita Vaz, a substância psicoativa encontrada na planta Cannabis sativa – o tetra-hidrocanabinol (THC) – não existe na semente, razão pela qual fica afastado o enquadramento do caso julgado em qualquer uma das hipóteses do artigo 33 da Lei 11.343/2006, que descreve o crime de tráfico.
“No mais, a lei de regência prevê como conduta delituosa o semeio, o cultivo ou a colheita da planta proibida (artigo 33, parágrafo 1º, inciso II; e artigo 28, parágrafo 1º). Embora a semente seja um pressuposto necessário para a primeira ação, e a planta para as demais, a importação (ou qualquer dos demais núcleos verbais) da semente não está descrita como conduta típica na Lei de Drogas”, apontou.
STF
Laurita Vaz destacou ainda que o entendimento firmado pelo STJ está de acordo com decisões recentes do Supremo Tribunal Federal (STF), que também tem reconhecido a ausência de justa causa e determinado o trancamento de ações penais nos casos que envolvem importação de sementes de maconha em reduzida quantidade, especialmente porque tais sementes não contêm o princípio ativo da droga.
“Em homenagem à segurança jurídica e ao princípio da razoável duração do processo, curvo-me ao entendimento majoritário já formado neste Superior Tribunal de Justiça, que está em consonância com os precedentes da Suprema Corte que consideram atípica a importação de pequena quantidade de sementes de maconha”, concluiu a ministra.
Ao acolher os embargos de divergência, a Terceira Seção, por unanimidade, determinou o trancamento da ação contra o recorrente, acusado de importar 16 sementes da Holanda.
Advogado comemora decisão com ressalvas
Rodrigo Mesquita, membro da Comissão de Assuntos Regulatórios do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e diretor jurídico da startup Adwa Cannabis, celebrou o veredito.
“A decisão unifica a jurisprudência das duas turmas com competência criminal do Tribunal e se alinha com o entendimento da 2a Turma do STF. Grande dia”.
O jurista, no entanto, ponderou: “não acredito em impacto imediato na política, pois não há efeito vinculante na decisão e me parece improvável mudança de orientação da Polícia Federal”.