Eduardo Curi encontrou na Cannabis uma ferramenta importante para a prática de uma psiquiatria mais progressista e humanizada
Um movimento iniciado na Itália em meados da década de 1980 marcou a vida do psiquiatra Eduardo Curi, e de toda sua profissão. Até então, a psiquiatria era mantida por práticas bastante agressivas, com eletrochoques, internações forçadas e as chamadas camisas de força químicas.
“Os pacientes mal conseguiam andar, ficavam babando”, lembra. “Qualquer problema que o paciente apresentava, era internado. Jogado nos manicômios e submetido àqueles tratamentos. Muitos dos pacientes ficaram crônicos. Não conseguiam mais se adaptar à sociedade. Alguns pacientes ficavam internados por 50 anos, abandonados pelas famílias. Um horror.”
Uma nova psiquiatria
A reforma psiquiátrica e o movimento antimanicomial rompeu com essa estrutura, ao abandonar práticas muito agressivas e evitar internações, estimulando a convivência dos pacientes com a família.
“É uma leitura mais abrangente do paciente. Não trata como um esquizofrênico , um maluco. Vê toda a estrutura familiar, todo um processo de como ele chegou àquele ponto”, conta o psiquiatra.
“Isso afetou de forma positiva para minha visão da medicina, da psiquiatria, e eu comecei a sair um pouco da medicina clássica alopática que é padrão no mundo todo. Um modelo que os grandes laboratórios utilizam esse modelo para produzir e vender bastante remédio.”
Novos tratamentos
Este movimento fez com que o médico passasse a estudar outras possibilidades de tratamento que aumentassem seu arsenal terapêutico, como homeopatia e florais.
“A medicina vai do 0 ao 1000 de possibilidades. A psiquiatria tradicional evoluiu muito nas últimas décadas, com medicamentos bem modernos, com poucos efeitos colaterais. Na minha prática comecei a utilizaras alternativas, mantendo sempre tudo que estudei e me formei na psiquiatria, mas com essa visão progressista e mais humana”
Seu objetivo maior é que os pacientes sejam inseridos na sociedade e no seio familiar. Somente no último ano, porém, uma nova ferramenta começou a ajudar a atingir esse objetivo.
Cannabis na psiquiatria
Desde o início da pandemia, começou a aparecer em seu consultório um número cada vez maior de pacientes que perguntavam sobre o tratamento com Cannabis medicinal. Sem conhecer muito sobre o assunto, como todo bom médico, se colocou a estudar. Fez cursos, pesquisas, conversou com médicos, e descobriu que, apesar do preconceito ainda existir, a psiquiatria é a segunda especialidade, atrás da neurologia, que mais prescreve a Cannabis.
Antes de começar a prescrever a seus pacientes que solicitaram, resolveu testar. Nem precisou ir longe, já que dentro de sua família havia quem pudesse se beneficiar da Cannabis. Sua sogra convivia há anos com um quadro grave de depressão. Já havia tomado todos os remédios possíveis e nada de melhorar.
Primeiros pacientes
“Ao longo desse processo de transtorno depressivo, ela, que tem 84 anos, foi ficando apática. Interagia pouco, não queria sair de casa. Ficava só dormindo e engordando”, afirma Curi. “Com a Cannabis, a mudança foi incrível. Ela vem tomando há menos de um ano e respondeu muito bem.”
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“Para se ter uma ideia, ela queria ficar só no quarto, dormindo. Sempre com a tevê ligada, mas nem via. Ficava no mundo dela”, continuou. “Hoje ela já senta com a família nos nossos encontros, participa. Está menos depressiva, está demonstrando vontade de sair de casa, passear. Toda a família ficou feliz.”
Preconceito e tabus
Este foi só o começo. Conforme se aprofundou nos estudos, entendeu que a proibição e o preconceito são os principais entraves para a Cannabis medicinal. “É cultural. O que é maconha e o que é canabidiol? Nos EUA, a maconha foi criminalizada por causa dos hippies na década de 70. Os mexicanos usavam e eram alvo de xenofobia. No Brasil, os escravos usavam, era cultural, trouxeram da África, mas encontraram o preconceito.”
Antes, porém, a planta já é cultivada há pelo menos 10 mil anos, sendo utilizada como fibra para tecido e corda e também por seus efeitos terapêuticos. “Foi criado todo um estigma, como uma droga nociva. Uma coisa má. Isso se expandiu pelo mundo todo, estimulado pelos americanos”, diz. “Mesmo com a pesquisa médica de hoje, o preconceito ainda existe. Tenho casos de pacientes que vêm até mim e dizem de psiquiatras que falam que não tem nada a ver. Que detona mesmo.”
Benefícios da Cannabis na psiquiatria
Em sua prática, porém, percebe diariamente os benefícios da Cannabis medicinal, principalmente ao reduzir ou eliminar a necessidade de medicamentos alopáticos. “O grande problema dos medicamentos tradicionais, principalmente em psiquiatria, é que vários deles provocam dependência. Uma das questões mais sérias que existem dentro do tratamento psiquiátrico”, conta.
“Principalmente os tarja preta, depois , para tirar, é muito difícil. Tem paciente que passa a vida inteira tomando rivotril, diazepam. Fora os efeitos colaterais no corpo. Muita gente não quer tomar medicamento psiquiátrico porque experimenta e reclama muito dos efeitos colaterais.”
Com a Cannabis, é diferente. “Praticamente não tem efeito colateral. Nenhum paciente que prescrevi relatou alguma coisa que alterou, por exemplo, o funcionamento sexual, a libido, ou engordou, ou perdeu a memória, as deficiências mais relevantes dos pacientes que fazem uso dos psicotrópicos.”
Segundo o médico, a longo prazo, o CBD ainda tem efeito antioxidante. “Vai melhorando o funcionamento das células nervosas, dos neurônios. É como se limpasse e produzisse uma mudança na estrutura celular, fazendo com que funcione melhor.”
Há pouco menos de um ano prescrevendo Cannabis medicinal, o médico acredita que ainda há muitos outros benefícios e possibilidades a serem descobertas, tanto por ele quanto por todas as ciências médicas.
“Tem muita pesquisa a ser feita, mas frente aos resultados que temos obtido, a perspectiva é muito boa. Tanto que os EUA, que condenaram a maconha, hoje são os maiores produtores”, diz Curi.
“Tem um mercado que gera emprego e renda para milhares de pessoas. Espero que os nossos responsáveis, governantes, tenham uma visão menos conservadora a respeito da Cannabis e consigam enxergar todo o potencial que tem como medicamento. Tudo de bom que ainda pode oferecer”, concluiu. “O futuro vai mostrar que o canabidiol é uma coisa maravilhosa que a natureza está oferecendo para a humanidade.“