Recentemente o STJ autorizou três pacientes a cultivarem suas próprias plantas de Cannabis no Brasil e a extração de canabidiol, o CBD, para uso próprio sob prescrição médica. A decisão pode orientar outros futuros processos e o cultivo pode ser uma alternativa de acesso a pacientes. Conversamos com especialistas para saber: é fácil plantar Cannabis para fins medicinais?
Considerados dois nomes de referência na medicina canabinoide do Brasil, a Dra. Maria Teresa Jacob e o Dr. Mario Grieco respondem a questão sobre o cultivo caseiro para fins medicinais.
Atenção com a origem da planta
A expressão “cepa” é usada para designar plantas que pertencem a uma mesma espécie ou classificação. Neste sentido, a Dra. Maria Teresa destaca a importância de escolher a cepa correta para o cultivo com fins medicinais:
“O ideal para se saber qual é a cepa, quais os conteúdos de canabinoides de terpenos, terpenoides, é que a plantação seja feita a partir de um clone da planta mãe. Onde você conhece todas as substâncias que estão naquela variedade. Além disso, além de se escolher uma planta adequada, uma cepa adequada, há de considerar as condições climáticas, latitude. Diferentes regiões vão ter plantas que vão estar mais expostas ao sol durante o período do dia do que outras regiões. Então, na verdade, vários fatores influenciam no cultivo da cannabis e para ser uma planta com fins medicinais tudo isso é extremamente importante”.
Clima do Brasil é uma vantagem
Como a Dra. Maria Teresa comentou, a incidência solar é imprescindível para a planta crescer. Por isso que muitas vezes em cultivo indoor de Cannabis vemos a utilização de luzes artificiais. O fato de estarmos em um país cuja maior parte do território está em clima tropical, é uma vantagem. A planta está adaptada a florescer somente quando se depara com noites de cerca de 12 horas, algo que acontece o ano todo na maior parte do Brasil. Assim, é possível plantar o ano todo.
“O objetivo do cultivador, as condições climáticas, o uso de fertilizantes ou não e as diferentes técnicas agronômicas vão ser muito importantes na determinação das variedades da Cannabis e em quais concentrações as substâncias vão estar presentes”, esclarece.
Padrão de cepas e de cultivo
Para alcançar uma segurança maior nos cultivos caseiros, a Dra. Maria Teresa entende que seja necessário uma estandardização das genéticas utilizadas. Basicamente, que existam características uniformes das plantas que serão cultivas de maneira artesanal em casa.
“O principal na produção de Cannabis medicinal é uma estandardização. Existem diferentes formas de sementes para distintas variedades. E isto é utilizado para classificar as diferentes variedades. Então a classificação é baseada no DNA mitocondrial que vai permitir distinguir as diferentes cepas e as diferentes espécies de outras plantas”, finaliza Dra. Maria Teresa.
Questão social e o acesso à Cannabis: o cultivo como uma alternativa
Os problemas sociais do Brasil e as diferenças de classe não podem ser ignorados. Neste sentido, o Dr. Mario entende que as possibilidades do cultivo caseiro são uma forma de acesso para pacientes e familiares.
“A Cannabis sendo cultivada ajudaria em algumas situações extremamente difíceis. Por exemplo, nós sabemos que nem todo mundo pode adquirir a Cannabis pelo preço que está. Então como vão fazer certas pessoas que não têm condições de comprar? Essa é a primeira grande pergunta. É a questão de acesso. Quem não tem condições como é que vai fazer para tratar da epilepsia de uma criança?”, reflete.
Importância da análise dos canabinoides
Embora entenda que plantar Cannabis não seja uma prática fácil, o Dr. Mario observa como uma alternativa devido ao valor de alguns produtos. E também enfatiza sobre como é imprescindível contar com instituições reconhecidas para que seja realizada uma análise das flores após a plantação. Pois apenas com esta análise é possível saber a porcentagem dos canabinoides que as plantas podem conter em seus óleos antes do uso.
“O cultivo abre uma oportunidade para alguns casos, para ajudar e fazer com que crianças possam utilizar a Cannabis. É claro que tem que ter uma série de cuidados. Inclusive depois da plantação é extremamente recomendável que essas mães ou familiares levem a Cannabis para ser avaliada numa instituição, que seja bem conhecida e capaz de fazer isso. Seja uma universidade ou a Fiocruz, por exemplo. Isso para saber exatamente o que contém e se pode ser utilizada. Isso é extremamente importante”, explica o médico que é autor do livro “Cannabis: Baseado em fatos“.
Medicina canabinoide no Brasil
Hoje em dia entende-se que todo o uso da Cannabis é feito com fins medicinais. Porém é imprescindível entender quais são os canabinoides que predominam na genética de uma planta que será cultiva. E quais são os níveis destes canabinoides. Pois estes dados interferem diretamente na maneira que a Cannabis irá interagir no corpo.
O primeiro passo para realizar um tratamento com Cannabis no Brasil é consultar com um médico prescritor da planta.