A Câmara dos Deputados entrou na reta final da discussão do Projeto de Lei 399/15, que regulamenta o plantio da Cannabis para fins medicinais e industriais no Brasil. A proposta que será apresentada autoriza o cultivo de Cannabis pelo SUS, por empresas e associações de pacientes.
O texto, de relatoria do deputado Luciano Ducci (PSB-PR), será entregue aos deputados nos próximos dias. A previsão, segundo a assessoria do parlamentar, é que seja votado nas próximas semanas no plenário da Câmara.
A proposta avança em diversos pontos ao texto original, mas o principal deles é o que permite o cultivo da Cannabis em solo nacional para pessoas jurídicas e
associações de pacientes, seja para o uso medicinal humano ou veterinário, mas também para fins industriais.
A mudança promete acesso mais amplo e barato para os pacientes, mas também para os interessados em investir neste promissor mercado, avalia Luciano Ducci.
“Para nós, a questão medicinal e o cultivo são os principais pontos. Não temos como avançar em pesquisa e em mercado se tivermos que importar, não faz sentido não plantarmos”, comenta o relator.
Principais pontos do Projeto de Lei Substitutivo ao 399/2015:
Altera o Artigo 2º da lei 11.343/2006, que dispõe que os medicamentos que contenham Cannabis ou substâncias canabinoides poderão ser comercializados no Brasil, desde que exista comprovação de sua eficácia terapêutica e que estejam devidamente atestadas por laudo médico.
O projeto prevê:
- Regras para o cultivo da Cannabis;
- Regras para pesquisa;
- Regras para a produção;
- Regras para comercialização de produtos à base de Cannabis.
- Prevê a permissão de cultivo associativo ou por pessoa jurídica previamente autorizada por órgão competente (para fins medicinais de uso humano a autorização será na Anvisa. Para fins veterinários e industriais será no MAPA);
- Prevê a permissão legal para uso medicinal humano e veterinário (o uso humano é amparado pela RDC 327/2019 e o veterinário não é permitido hoje);
- Prevê normas de segurança para o cultivo, a fim de que não haja desvios de finalidade: proteção do perímetro da área de cultivo, controle monitorado dos acessos, sistema de vídeo, alarmes e cercas elétricas. Para o cultivo de plantas psicoativas, o cultivo deve ser em ambiente fechado (estufas, por exemplo);
- Prevê a permissão do cultivo e a produção por associações, farmácias vivas do SUS. E os medicamentos podem ser produzidos também por farmácias magistrais (RDC 18/2013, dispõe sobre as farmácias vivas);
- Prevê que as regras que já incidem sobre a produção de medicamentos sejam aplicadas também às medicações à base de Cannabis, garantindo a segurança do produto;
- Prevê a produção de medicamentos nas formas permitidas em lei, fitoterápicos, fórmulas magistrais, *além de incluir os produtos tradicionais fitoterápicos, produtos magistrais fitoterápicos e produtos oficinais fitoterápicos*;
- Prevê o plantio de cânhamo industrial (planta não-psicoativa) e a possibilidade de produção industrial irrestrita com esta matéria prima;
- Prevê a possibilidade de importação e exportação de produtos à base de cannabis, assim como, os insumos necessários à produção e ao cultivo;
- Prevê que as associações legalmente constituídas na data da vigência da lei tenham até 24 meses para se adaptar às regras;
- Cria regras para segurança e controle da planta ao produto final, obedecendo à legislação infralegal já existente. Ex: cotas de cultivo pré-determinadas (de acordo com demanda reconhecida e autorizada),
- Rastreabilidade da produção (desde a semente, o processamento até o descarte), presença de responsável técnico para garantir as técnicas de boa práticas agrícolas e medicinais;
- Prevê que os remédios sejam sujeitos a controle especial e só sejam dispensados mediante prescrição por profissional legalmente habilitado;
- Proíbe a prescrição e a comercialização da planta ou de suas partes para pessoas físicas;
- Estabelece que plantas com mais de 1% de THC são plantas psicoativas. E que medicamentos com mais de 0,3% de THC são considerados psicoativos;
- Prevê que produtos de gênero alimentício não contenham THC;
- Prevê que medicamentos veterinários não podem ser psicoativos (menos de 0,3% de THC no produto final);
- Prevê a incorporação dos medicamentos à base da cannabis ao SUS.
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Comissão Especial debateu o tema por 10 meses com especialistas
A comissão que discute o tema foi formada na Câmara em outubro do ano passado. Recebeu pacientes, cientistas, médicos, autoridades e especialistas no tema do Brasil e de outros países. Ouviu também as opiniões contrárias.
A comissão também fez visitas técnicas ao Uruguai e à Colômbia, dois dos países vizinhos ao Brasil que já regulamentaram a Cannabis, para conhecer os modelos de legislação e de mercado.
“Abrimos espaço para todas as vozes. Das mais favoráveis às menos. Nem sempre vamos conseguir atender a todos, mas com certeza, o projeto que vai ser apresentado para os deputados altera de forma segura a maneira como lidamos com a Cannabis no Brasil e abre um mercado promissor, tanto do ponto de vista médico, quanto econômico”, argumentou Ducci.
O parlamentar garante que, ao contrário dos que os críticos apontam, o projeto não abre espaço para o mercado das drogas e também não prevê o plantio individual.
“O ponto mais sensível do projeto são os medicamentos. É inegociável que todo o processo produtivo se submeta à fiscalização, tanto para garantir um plantio seguro, sem desvios, quanto para termos a qualidade nos remédios”, completa o relator, que é também médico pediatra.
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Acesso aos pacientes
Em 2015, o Brasil autorizou a importação de medicamentos à base de Cannabis. Já no fim do ano passado, a Anvisa regulamentou os procedimentos para a concessão da autorização sanitária de fabricação e importação desses medicamentos, além dos requisitos para a comercialização, a prescrição, a dispensação, o monitoramento e a fiscalização de produtos da cannabis para fins medicinais no Brasil.
Hoje, são dois medicamentos disponíveis nas farmácias formulados à base de canabinoides (compostos ativos da planta de cannabis), o Mevatyl e o Sativex.
Conforme último levantamento da Anvisa, 7.800 pessoas possuem essa autorização para a importação. Segundo estimativas da própria agência, 12 milhões de pessoas no Brasil sofrem de alguma enfermidade para qual a Cannabis é indicada.
“Não estamos legalizando a maconha. Aliás, é importante reafirmar que remédios à base de Cannabis já são vendidos em farmácias no Brasil. O que queremos é que sejam acessíveis. Hoje, um tratamento com estes remédios disponíveis custa de R$ 2 mil a R$ 3 mil por mês, muito longe da realidade da maioria da população brasileira”, alerta Ducci.
Se, por um lado, o remédio disponível na farmácia é inacessível à maioria, os que têm acesso a advogados, buscam o direito ao tratamento pelo SUS na justiça. E já são mais de uma centena de decisões favoráveis para que pacientes consigam que o sistema único de saúde banque o tratamento ou para que a justiça permita o plantio doméstico.
A intenção da lei é de que os pacientes que tenham prescrição médica, consigam ter acesso mais facilitado e mais barato, inclusive por meio do SUS.
Mercado bilionário
A estimativa é de que no Brasil, com a legalização, só com a cannabis medicinal se movimenta um mercado de cerca de R$ 47 bilhões. Os dados são da New Frontier Data, autoridade global da indústria de Cannabis em relatórios de inteligência de negócios e análise de dados.
No mundo, a consultoria Euromonitor International estimou que até 2025, a cannabis vai movimentar US$ 166 bilhões por ano. Este valor representa um aumento de cerca de 1.200% em relação a 2018, quando esse mercado movimentou US$ 12 bilhões.
Outras legislações e regulamentos que se relacionam com o projeto
- RDC nº9/2015 – sobre pesquisa;
- Lei n°13.243/2016- sobre pesquisa
- Lei nº10.711/2003 – lei de sementes;
- Portaria n°886/2010 – instituição das farmácias vivas;
- Lei nº5.991/1973 – dispõe sobre controle sanitário de medicamentos
- Lei n°6.360/1976 – vigilância sanitária para medicamentos, insumos