O neurocientista, pesquisador e escritor Sidarta Ribeiro tem uma contribuição importantíssima para o campo da neurociência e integra grupos de pesquisa em instituições de respeito, como a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e a Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Ele também é divulgador científico e já publicou obras sobre a mente, a memória e o sono, além de participar de congressos e mesas de debate.
No mês de novembro de 2023, Sidarta lançou seu livro mais recente, As Flores do Bem – A ciência e a história da libertação da maconha, uma obra de linguagem simples, para falar sobre uma planta que ele já investigara anteriormente: a Cannabis.
Esse é o segundo livro do autor sobre esse tema, em 2007 ele publicou Maconha, Cérebro e Saúde em parceria com Renato Malcher-Lopes, que também é pesquisador da área das ciências biológicas e neurociência. Porém, em As Flores do Bem leremos menos o Sidarta cientista e mais o Sidarta habilidoso com as palavras, que trata um assunto tão complexo em uma prosa muito gostosa de ler.
Bati um papo com Sidarta Ribeiro para conversar sobre As Flores do Bem, sistema endocanabinoide e o potencial transformador que essa planta possui. Se você quiser ler o livro, pode comprar na versão física ou e-book no site da editora Fósforo.
Leitura para quebrar preconceitos sobre a Cannabis
Aqui no portal Cannabis & Saúde sempre trazemos histórias de pessoas que tiveram a vida transformada pela Cannabis. Em muitos casos, essa transformação faz as pessoas esquecem qualquer preconceito que tinham com a planta.
Com o livro As Flores do Bem, Sidarta tem o objetivo de fazer seus leitores superarem o preconceito com a Cannabis sem a necessidade de ficarem doentes ou ter algum familiar com uma doença severa. O autor lembrou que isso é fundamental para avançarmos nesse debate.
“A maconha tem a capacidade de esclarecer o pensamento da pessoa muito rapidamente quando a pessoa fica doente ou quando alguém da sua família fica doente. Aí, as pessoas se convertem imediatamente, venham de qualquer espectro político ou religioso. Eu já vi essas conversões e em outras gerações também, pessoas super idosas, super conservadoras: ‘Fiquei doente? Opa, eu quero meu óleo de Cannabis!’ Então, isso eu já vi acontecer muitas vezes. Acho que o desejo do Flores do Bem é que ele possa fazer esse papel antes da doença.
A proposta do Flores do Bem é que as pessoas saiam municiadas de argumentos para elas não brigarem com ninguém, mas conversarem. Para gente ver se a gente se entende. Porque maconha não é para jovens a não ser com indicação médica, mas é para adultos e idosos. Então, é do interesse coletivo que a gente avance o debate.”
Cannabis é planta
Para avançar o debate, Sidarta propõe que a gente trate a Cannabis como ela é: uma planta. Na capa do livro já é possível perceber essa ideia, já que temos várias flores juntas entre elas as de Cannabis.
Atualmente temos diversos formatos de produtos disponíveis, como cápsulas, cremes, óleos e balas de goma, no entanto Sidarta defende que tenhamos uma relação mais próxima com a Cannabis, como uma planta medicinal similar aquelas que já utilizamos no nosso dia a dia.
“Se uma uma pessoa idosa está fazendo [o uso da Cannabis] como uma reposição por causa da queda dos níveis de endocanabinoides. Em que medida isso é diferente de falar assim:
– Eu tomo vitamina C todo dia de manhã para evitar escorbuto.
– Na forma de drágea?
– Não, na forma de laranja, na forma de limão.
– Quantos miligramas?
– Não sei. Tomo um copo, dois copos, isso impede que a gente tenha escorbuto.A gente precisa ir lá se pesar e saber quantos miligramas de vitamina C tomou? Não. Mas se parar de tomar, vai dar problema? Vai. Então, eu acho que para muitas indicações, a gente está no âmbito da maconha como planta medicinal, que você faz chá com a folha dela e etc.”
Antigamente vinculada à rebeldia e à juventude, a Cannabis é, na verdade, um suplemento extremamente benéfico para pessoas na terceira idade. Você pode entender melhor essa relação numa live que fizemos com a Dra. Juliana Sudário.
A polêmica do uso medicinal vs. uso adulto
Outro debate que o livro Flores do Bem se propõe a fazer é sobre os diversos usos da Cannabis. Aqui no nosso país, o tema é polêmico, mas o autor não foge das polêmicas e explora o que seria o uso adulto ou recreativo da planta.
Assim como fez no livro, na entrevista Sidarta usa a música para dar um exemplo prático sobre o uso não-medicinal da Cannabis.
“Uma questão é a fronteira tênue entre o terapêutico e recreativo, uma coisa que Flores do Bem se propõe a fazer é questionar isso e falar: “Bom, por que você pode tomar óleo de Cannabis para dor neuropática e não pode tomar óleo de Cannabis para ouvir Peter Tosh? Ou Mozart? Ou Clara Schumann? Então, essa é uma discussão importante. Qual é o problema? É a culpa Cristã? O que está pegando? É o capitalismo que quer que as pessoas trabalhem o tempo todo e não relaxem? O livro problematiza tudo isso. Eu acho que a gente tem que entender, porque ela se presta para usos muito diferentes.”
A Cannabis tem despertado enorme interesse de pesquisadores de todo o mundo pelas suas propriedades medicinais. Ela é uma planta medicinal, mas ela também pode ser muito mais do que isso. Temos a sessão Cânhamo News, onde falamos do potencial para a indústria, e também já falamos do uso ritualístico da cultura rastafari.
Sistema endocanabinoide nos cursos de Medicina
Na entrevista, também falamos da demanda que a sociedade tem para que os profissionais da saúde entendam o papel do sistema endocanabinoide. Hoje em dia, ainda são poucos os médicos ou dentistas que compreendem que nosso corpo produz sua própria Cannabis. Dessa forma, Sidarta Ribeiro entende que a formação e atualização nas áreas da Medicina e Odontologia precisam ser reformuladas.
“Esse é o maior problema que a gente tem nesse debate: os profissionais da saúde e as profissionais da saúde de quase todas as gerações não tiveram absolutamente nada sobre o sistema endocanabinoide. Nem nas suas aulas de graduação, nem nos congressos que frequentam regularmente para se atualizar. Então, como eles não sabem, eles se atualizam sobre o que não sabem. Isso aconteceu, isso ainda marca esse problema, mas isso mudou muito nos últimos 10 anos. Hoje tem um monte de médicos e médicas prescritores excelentes e outros profissionais da saúde também fazendo prescrição e está rolando. Está acontecendo e é uma transformação é uma emergência da sociedade civil.”
Leia sobre Cannabis
Fica a recomendação, leiam As Flores do Bem! Não é um livro técnico, mas traz muita sabedoria e conhecimento nas suas páginas. Sidarta Ribeiro traz um conteúdo de muita relevância independente do seu grau de entendimento sobre esse tema ou da sua formação acadêmica.
Fica também a recomendação para você acessar a nossa biblioteca virtual. Lá disponibilizamos diversos e-books gratuitos sobre o uso medicinal da Cannabis para diversas condições de saúde, além de relatos de médicos e pacientes.