Em entrevista ao portal Cannabis & Saúde, o presidente da Federação Brasileira das Associações de Doenças Raras falou sobre seu trabalho frente à entidade e como a Cannabis pode ajudar as famílias
O empresário e cientista político Antoine Daher, de 45 anos, é líbano-brasileiro e se envolveu com a causa das doenças raras no nosso país depois que o filho dele, o Anthony, foi diagnosticado com a Síndrome de Hunter, um distúrbio genético grave. Vendo as dificuldades que pacientes e familiares encontram na saúde pública do brasil, Antoine fundou a Casa Hunter.
Hoje ele também preside a Febrararas, a Federação Brasileira das Associações de Doenças Raras, que nasceu da necessidade de articulação e representatividade das associações dos raros espalhadas pelo país.
Nos últimos anos, a Cannabis medicinal tem se mostrado um bom tratamento para pacientes com doenças raras. Por isso, Antoine vai compartilhar essas histórias em agosto no seminário Cannabis Medical Summit, que é online e gratuito. Mas antes, ele conversou com o portal Cannabis & Saúde.
“Nossa missão é acolher portadores de doenças raras e seus familiares; promover ações com objetivo de diagnosticar, prevenir e tratar doenças raras e afins. mobilizar a sociedade civil, influenciar políticas públicas e conjugar esforços para atender as demandas dos pacientes”.
Segundo Antoine, estima-se que cerca de 60% dos pacientes diagnosticados com doenças raras possuem algum grau de autismo associado aos sintomas das doenças. E autismo é uma condição que a Cannabis tem tido bons resultados (confira aqui o Guia definitivo sobre o CBD e autismo)
Outra condição comum aos raros são as crises epiléticas. Em casos graves, afirma Daher, pacientes podem morrer durante essas crises.
“Estudos com as substâncias derivadas da Cannabis confirmam o potencial desses medicamentos para o tratamento das epilepsias refratárias. Os doentes raros representam boa parte da população-alvo desses estudos”, contou.
O empresário também informou que está sendo criado o primeiro centro de referência para o tratamento de Doenças Raras, em Porto Alegre (RS).
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Confira a entrevista na íntegra
Qual sua formação? Qual sua trajetória até se tornar o fundador da casa Hunter? E como chegou a se tornar presidente da Febrararas, Federação Brasileira das Associações de Doenças Raras?
Sou empresário formado em Ciências Políticas. Fundei a Casa Hunter após ter o diagnóstico do meu filho com a Síndrome de Hunter (Mucopolissacoridose Tipo II – MPS II). Eu vi a dificuldade que pacientes e familiares encontram para fechar um diagnóstico, encontrar tratamento e informações em geral.
Os pacientes raros necessitam de apoio multidisciplinar. Mas o modelo oferecido hoje, em nosso sistema de saúde, não contempla essa demanda.
A Federação Brasileira das Associações de Doenças Raras nasceu da necessidade de articulação e representatividade das associações de raros espalhadas pelo país. Devido às ações desenvolvidas pela Casa Hunter, especialmente em políticas públicas, fui cotado para a presidência da Febrararas. No momento, estou no segundo ano do mandato.
O que a Casa Hunter Oferece? Missão, visão, valores? Futuro? Como a casa Hunter sobrevive?
Nossa missão é acolher portadores de doenças raras e seus familiares; promover ações com objetivo de diagnosticar, prevenir e tratar doenças raras e afins. Nós buscamos mobilizar a sociedade civil, influenciar políticas públicas e conjugar esforços para atender todas as demandas dos pacientes.
Nossa visão é que não podemos desprezar a oportunidade de agir no presente para atingir o futuro desejado. O trabalho ordenado dos profissionais envolvidos, no processo de capacitação, estudos clínicos, pesquisa e fomento de novas tecnologias, torna a Casa Hunter referência em doenças genéticas; um “porto-seguro” para acolher as famílias com doenças raras. A Casa Hunter sobrevive através de doações e apoios angariados entre pessoas físicas e privadas.
O que são doenças raras? Quais as principais ou mais conhecidas?
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), doença rara é uma afecção que acomete em até 65 pessoas para cada 100 mil. As mais conhecidas são a fibrose cística e a fenilcetonúria, diagnosticadas no teste do pezinho. Também a esclerose lateral amiotrófica e o lúpus.
Como hoje são vistas as pessoas com doenças raras pelo governo brasileiro? Há apoio?
Em janeiro de 2014, o governo brasileiro instituiu a Política Nacional de Atenção Integral às Pessoas com Doenças Raras, através da Portaria 199. O documento resume as principais preocupações dos raros, como a política de acesso a tratamento e diagnóstico.
Em termos práticos, registramos nos últimos anos um aumento do número de centros de tratamento de raros e o crescimento expressivo de incorporações de drogas órfãs, o que constitui um avanço.
Em contrapartida, as demandas deste grupo de pacientes ainda esbarram na falta de transparência no trabalho da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS. E também na capacitação técnica e atualização de médicos e não-médicos. Isso facilitaria o diagnóstico e manejo das patologias raras.
Por conta dessa última demanda em especial, estamos criando o primeiro centro de referência para o tratamento de Doenças Raras, completamente capacitado para esta tarefa, em Porto Alegre (RS). Trata-se de uma iniciativa da Casa Hunter em parceria com o Instituto Genética para Todos (IGPT), que estará concluída até o fim do próximo ano.
Qual a importância da Cannabis para os tratamentos de doenças raras? Para quais doenças a Cannabis é aplicável?
Diversos estudos apontam para a eficácia e segurança de tratamentos realizados a partir das substâncias derivadas da Cannabis. Os doentes raros representam boa parte da população-alvo desses estudos.
Além disso, estima-se que cerca de 60% dos pacientes diagnosticados com doenças raras possuem algum grau de autismo associado aos sintomas das doenças.
Atualmente, por exemplo, não há nenhum tratamento medicamentoso para o curso da doença e mesmo para os seus sintomas específicos para portadores de Mucopolissacaridosse III. Em muitos casos, esses pacientes vão a óbito em crise epilética.
Estudos com as substâncias derivadas da Cannabis confirmam o potencial desses medicamentos para o tratamento das epilepsias refratárias.
O senhor está trazendo para o evento o caso da mãe da Gabriely, a Lívia Queiroz. O que podemos esperar?
A Gabriely é uma paciente com MPS Tipo III (San Phillipo), ainda sem tratamento específico. Espero que o caso dela seja útil para mostrarmos que nenhuma terapia deve ser descartada sem ser testada.
Na sua visão, qual a importância do evento Cannabis Medical Summit para o mercado de cannabis medicinal no país?
Trata-se de mais uma oportunidade de acompanhar o que está sendo desenvolvido em pesquisas sobre o Cannabis e, com isso, conhecer novas possibilidades de tratamento para os pacientes com doenças raras.
Que recado gostaria de dar para as mais de 12 mil pessoas inscritas no evento, na data de hoje?
A união de esforços em torno da pesquisa da Cannabis medicinal pode representar tratamento e a consequente melhora da qualidade de vida de inúmeros pacientes. Em especial, para as pessoas com doenças raras, que em sua absoluta maioria permanece sem medicação.