Presente na literatura médica desde o Século XIX, estudos indicam o potencial de pomadas e cremes à base de Cannabis para aliviar doenças dermatológicas, como dermatite, acne e psoríase. A comunidade científica, no entanto, ainda é bastante cautelosa sobre o assunto.
O que é a psoríase, acne e dermatite?
As doenças de pele são hoje a quarta principal causa de incapacitação do mundo, segundo uma revisão publicada pela Universidade do Colorado, nos Estados Unidos, que analisou estudos de 1980 a 2013. Dermatite, acne e psoríase são os transtornos inflamatórios da pele mais comuns na população.
Existem três tipos mais comuns de dermatite. A atópica surge sem motivo aparente e costuma estar ligada a crises de rinite e asma. Pode causar vermelhidão e lesões e é mais comum em crianças.
Em adultos, ocorre com mais frequência a dermatite de contato, uma irritação que surge após exposição a alguma substância, como perfume, ou tecidos. A pele arde, fica vermelha, descasca e pode formar bolhas. Há também a dermatite seborreica, conhecida como caspa, que na maior parte dos casos gera apenas descamação do couro cabeludo e sobrancelhas.
Acne é uma doença de pele que causa espinhas, cravos, pápulas e cistos. As glândulas sebáceas secretam as gorduras para criar um manto protetor para a pele. Oito em cada dez pessoas já tiveram espinhas alguma vez na vida. Em condições mais agudas, deixa de ser uma questão estética e pode causar dor e problemas psicológicos.
Já a psoríase é uma doença em que as células da pele se acumulam e formam escamas e manchas secas que causam coceira. Acredita-se que seja um problema do sistema imunológico. Os gatilhos incluem infecções, estresse e frio. O sintoma mais comum é uma irritação na pele. Contudo, às vezes a erupção envolve unhas ou articulações.
Quais são as pomadas indicadas para Acne, Psoríase e Dermatite?
Dermatite não tem cura, mas pode ser controlada com pomadas e cremes corticoides que estimulam a cicatrização. É o caso da betametasona ou da dexametasona, por exemplo. Porém, devem ser prescritos pelo dermatologista.
Para acne, existem inúmeras opções no mercado, desde remédios, pomadas antibióticas e pílulas anticoncepcionais, que diminuem a oleosidade da pele. Entre os fármacos, está a Isotretinoína, uma substância que atua na glândula sebácea, diminuindo a produção de sebo, reduzindo a proliferação de bactérias e inflamação. Tem nome comercial de Roacutan e é vendido com prescrição médica.
Por fim, o tratamento para psoríase depende do tipo, localização e extensão das lesões. Pode ser feito com cremes ou pomadas com corticoides e retinoides ou remédios de uso oral, como ciclosporina, metotrexato ou acitretina, por exemplo, mediante recomendação do médico.
Porém, os efeitos colaterais desses tratamentos devem ser vistos com atenção. Os antibióticos podem causar tonturas, náuseas, vômitos, diarreia. A Isotretinoína provoca dores musculares, aumento do colesterol, anemia e conjuntivite. Já o anticoncepcional causa tensão mamária, dores de cabeça, aumento do peso e alterações no humor.
Doenças de pele podem ser tratadas com Cannabis?
O primeiro livro a descrever terapias dermatológicas, “Um tratado sobre a matéria médica e terapêutica da pele”, publicado em 1881, já trazia indicações sobre os efeitos da Cannabis em doenças de pele.
“Uma pílula de Cannabis indica na hora de dormir proporciona às vezes às minhas mãos alívio para a coceira intolerável do eczema”, comentou o Dr. Henry Granger Piffard, um dos fundadores da dermatologia americana.
É surpreendente que quase 150 anos depois e após estudos publicados sobre os benefícios dos canabinoides, inclusive para a pele, a prescrição seja praticamente inexistente em consultórios do Brasil.
“Se comparado às terapias das áreas de neurologia e psiquiatria, a questão da Cannabis para os problemas da pele ainda é incipiente. Não temos clareza, não há comprovação clínica de resposta, e os profissionais têm pouca experiência no assunto”, avalia Breno Marzola, dermatologista especializado em imunodermatologia, que trabalha no Centro de Pesquisa de Bento Gonçalves (RS) e na Braimuno de Itajaí (SC).
Ao fazer pós-doutorado na Dinamarca e conhecer de perto a vida dos usuários de maconha e haxixe em Christiania, comunidade independente e autogestionada na Copenhague, o médico começou a estudar sobre as aplicações da Cannabis na pele.
“Me interessam muito os efeitos antagônicos dos principais princípios ativos, o THC e o CBD. Sabemos que o THC presente na maconha fumada pode acarretar em pioras do quadro acneico e de hidradenite supurativa (doença crônica inflamatória, presente em áreas como axilas, virilha e glúteos). Por outro lado, há indicações que o CDB tenha efeito nos sistemas imunológicos e assim poderia controlar o processo inflamatório comum a várias doenças de pele, como psoríase e acne”, acrescenta ele, citando os conhecidos efeitos reguladores do sistema endocanabinoide sobre o estresse, inflamações e funcionamento do sistema imunológico.
A descriminalização e a legalização de produtos dermatológicos à base de Cannabis em mercados como Estados Unidos e Europa têm promovido um aumento na oferta de cremes, pomadas e bálsamos com a promessa de curar ou aliviar os sintomas de doenças como dermatite (ou eczema) de contato, ressecamento da pele, acne, psoríase, esclerose sistêmica cutânea e até mesmo câncer de pele.
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Estudos médicos mais recentes sobre a eficácia do uso do Cannabis para Psoríase
Um estudo de 2019 (Um efeito terapêutico da pomada enriquecida com CBD em doenças inflamatórias da pele e cicatrizes cutâneas) investigou o efeito terapêutico da pomada de CBD administrada em doenças crônicas graves da pele e suas cicatrizes. Vinte pacientes com psoríase (5), dermatite atópica (5) e cicatrizes resultantes (10) administraram a pomada nas áreas lesionadas da pele duas vezes ao dia durante três meses.
Os resultados mostraram que o tratamento melhorou significativamente os parâmetros da pele, os sintomas e também a pontuação do índice PASI (que mede a gravidade da psoríase). Nenhuma reação irritante ou alérgica foi documentada durante o período de tratamento.
Outra pesquisa de 2016 (Agonistas seletivos do receptor de canabinoide-1 regulam a ativação de mastócitos em um modelo de dermatite atópica induzida por oxazolona) mostrou que os canabinoides diminuíram a inflamação da pele em ratos com dermatite, reduzindo a ativação de mastócitos, que é um processo inflamatório que também ocorre na psoríase.
Conclusão
A administração tópica de pomadas de CBD, sem THC, é uma alternativa não-invasiva segura e eficaz para melhorar a qualidade de vida em pacientes com alguns distúrbios da pele, especialmente no fundo inflamatório.
Entretanto, a comunidade científica é mais cautelosa do que os produtores e consumidores: apesar de atestarem o potencial dos produtos em tratar uma variedade de doenças da pele, os pesquisadores destacam a falta de ensaios clínicos randomizados e em larga escala, de alta qualidade, que avaliem os efeitos dos tratamentos.
Somente após investigações adicionais eles poderiam ser considerados seguros e eficazes para essas condições.
“Realmente precisamos de mais pesquisas, discussões científicas e tempo de avaliação clínica. Com tão pouca prescrição aqui no Brasil, ainda é cedo para medir os resultados, mas tenho conversado com colegas no Uruguai e eles estão prescrevendo para psoríase, por exemplo”, finaliza Marzola.