Quando falamos sobre o uso de Canabidiol (CBD), uma das dúvidas mais frequentes nos consultórios é se ele vicia.
Para esclarecer essa questão, convidamos o Dr. Ricardo Ferreira (CRM: 52706973), médico experiente na prescrição de derivados da Cannabis, que compartilha sua experiência ao lidar com pacientes.
Segundo ele, essa pergunta revela a necessidade de educação e informação sobre a terapia canabinoide, ainda cercada por preconceitos e falta de conhecimento.
O uso de Cannabis, quando orientado por um profissional, pode ser uma alternativa ou complemento seguro para o tratamento de diversas condições, especialmente quando comparado a substâncias como benzodiazepínicos, álcool e nicotina, que têm potencial de vício significativamente maior.
Isso reforça a importância do acompanhamento profissional adequado e do esclarecimento sobre os verdadeiros riscos e benefícios desse tratamento. E é isso que abordaremos nas linhas que se seguem.
Para saber se o Canabidiol vicia e outras informações relevantes, prossiga com a leitura e aprenda sobre:
- O Canabidiol vicia?
- Como o Canabidiol funciona no corpo humano?
- Quais são os sinais de que o Canabidiol pode estar viciando?
- Se a dependência em relação à Cannabis acontecer?
- Quais cuidados tomar no uso do Canabidiol para evitar vício?
- A Cannabis medicinal no tratamento de dependência de outras drogas
- Como iniciar um tratamento complementar com a Cannabis medicinal?
O Canabidiol vicia?
Quando um médico prescreve uma terapia à base de Canabidiol, é comum que muitos pacientes se perguntem se essa substância vicia.
Mas a resposta direta para tal questão é: não, o Canabidiol, em si, não vicia. Esse é um ponto amplamente confirmado pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
Em um relatório de 2017, a OMS declarou que o CBD, uma das substâncias ativas encontradas na planta de Cannabis, não possui efeito psicoativo e, portanto, não leva à dependência ou ao abuso. Mas por que o canabidiol não vicia?
O vício está relacionado à forma como uma substância interage com o sistema de recompensa do cérebro, que envolve a liberação de dopamina em regiões específicas do cérebro, como o núcleo accumbens.
Substâncias viciantes tendem a ativar esse sistema de forma exagerada, gerando uma sensação de prazer intenso que o corpo deseja repetir. No entanto, o CBD age de maneira completamente diferente.
Ele interage com o sistema endocanabinoide, principalmente por meio dos receptores CB1 e CB2, mas sem ativar diretamente as regiões ligadas ao vício.
Em paralelo a isto, o Canabidiol tem sido estudado por sua capacidade de ajudar no controle de sintomas da abstinência e até como auxílio no tratamento de dependências químicas, como a dependência de opioides.
Ao contrário de substâncias que afetam diretamente os circuitos de prazer e motivação no cérebro, o CBD tende a modular esses sistemas, promovendo o equilíbrio sem gerar o ciclo de “recompensa imediata”.
Qual é a diferença entre Canabidiol e THC em relação ao vício?
O Canabidiol, em si, não vicia, mas a Cannabis pode viciar por ter substâncias psicoativas em sua composição, como é o caso do THC.
O motivo pelo qual o THC pode ser viciante está na forma como ele age com o cérebro. Este composto ativa diretamente os receptores CB1, localizados em áreas responsáveis por controlar a sensação de prazer.
Em altas doses, ele leva à liberação intensa de dopamina, o que pode criar um ciclo de dependência devido ao prazer que esse mecanismo gera.
Por outro lado, o Canabidiol não vicia porque age de forma bem diferente. Ele tem pouca afinidade com os receptores CB1 e CB2 e, em vez de ativá-los diretamente, atua como um modulador, equilibrando o sistema endocanabinoide sem gerar efeitos psicoativos.
Essa diferença biológica explica por que o THC pode ser viciante, enquanto o CBD não tem esse risco, sendo uma opção segura para quem busca os benefícios terapêuticos da Cannabis sem preocupações.
Como o Canabidiol funciona no corpo humano?
O Canabidiol atua de muitas maneiras no corpo humano, mas seu principal alvo é o sistema endocanabinoide (SEC).
Esse sistema é uma rede de receptores e moléculas que ajudam a regular uma série de funções, como humor, sono, apetite, dor e resposta imune.
O CBD interage com os receptores CB1 e CB2, que estão distribuídos por todo o corpo. O receptor CB1 é mais abundante no cérebro e no sistema nervoso central, enquanto o CB2 é encontrado principalmente no sistema imunológico.
Além de agir sobre o SEC, o Canabidiol também influencia outros sistemas. Ele pode aumentar os níveis de anandamida, um neurotransmissor conhecido como a “molécula da felicidade”, ajudando a regular o humor e reduzir a dor.
Também pode interagir com receptores de serotonina, envolvidos no controle do humor e da ansiedade, o que explica seu uso no tratamento de transtornos como ansiedade e depressão.
Esses mecanismos o tornam versátil no manejo de diversas condições, como inflamação, dor crônica, epilepsia e distúrbios do sono.
Ou seja, ele não age como uma cura mágica, mas ajuda a trazer equilíbrio, promovendo homeostase interna e auxiliando na prevenção do desenvolvimento de patologias associadas ao desequilíbrio do SEC.
Quais são os sinais de que o Canabidiol pode estar viciando?
Existe uma diferença entre dependência física e hábito. O CBD não age no corpo de maneira a criar dependência física, pois não ativa o sistema de recompensa no cérebro, como a nicotina ou opioides.
Ainda assim, algumas pessoas podem desenvolver um comportamento de uso exagerado ou abusivo, o que é diferente de uma dependência fisiológica.
Neste caso, ele pode causar um tipo de dependência chamada psíquica comportamental.
E isso não acontece só com a Cannabis. Acontece também com opioides, antidepressivos, benzodiazepínicos e anticonvulsivantes.
Neste sentido é importante esclarecer que a dependência psíquica comportamental se refere a um padrão de comportamento repetitivo e compulsivo.
Esses comportamentos podem se tornar hábitos arraigados e difíceis de controlar, muitas vezes resultando em um ciclo vicioso.
Esse tipo de dependência não envolve necessariamente substâncias químicas, como no caso das drogas ou álcool, mas sim ações, atividades ou comportamentos que se tornam um meio de lidar com emoções, estresse, tédio ou outras situações difíceis.
Ou seja, se você notar que está usando o CBD constantemente para lidar com questões emocionais ou estresse, sem buscar outras formas de resolução, isso pode indicar uma forma de apego psicológico, mas não um vício químico.
Outro sinal de que o uso do CBD pode estar fora de controle é quando a pessoa começa a aumentar a dose sem orientação médica, buscando efeitos maiores ou diferentes do que inicialmente.
Do mesmo modo, se você perceber que depende exclusivamente do CBD para se sentir relaxado ou para dormir, talvez você esteja criando um hábito que, embora não seja viciante, pode não ser saudável a longo prazo.
E se a dependência em relação à Cannabis acontecer?
É importante destacar que o uso de canabinoides, como o CBD e o THC, com acompanhamento médico é totalmente diferente do uso adulto.
O Dr. Ricardo alega que “Quando falamos do uso crônico de maneira recreativa, uso adulto, existe a estatística de que 10% de usuários crônicos de Cannabis podem desenvolver dependência. Mas é o uso adulto, recreacional, de forma contínua e prolongada.”
“Quando a gente fala da Cannabis de uso medicinal, que o objetivo não é a psicoatividade, não temos estatística. Eu nunca percebi nenhum paciente meu com este problema. Mas se acontecer é uma dependência muito menor se comparada à dependência de nicotina e álcool”, completou ele.
Neste sentido, Dr. Ricardo esclarece que é uma dependência diferente do que de benzodiazepínicos e opioides, pois não causa abstinência, não causa fissuras.
“A pessoa sente falta por um tempo, mas depois ela supera. Pois não é uma dependência química real, é uma dependência psíquica comportamental”, sinaliza.
Quais cuidados tomar no uso do Canabidiol para evitar vício?
Assim como ocorre com qualquer substância que afeta o sistema nervoso, o consumo de Canabidiol deve ser feito com cuidado, especialmente em longo prazo.
O risco de vício é baixo, mas o uso descontrolado ou a automedicação podem criar a dependência psicológica em busca de alívio imediato.
Com o uso contínuo, os cuidados com dosagem, acompanhamento médico e escolha de produtos de qualidade tornam-se ainda mais relevantes.
É por isso que, se você estiver em tratamento com Canabidiol, deve ter em mente os seguintes pontos a fim de minimizar ainda mais este risco:
1. Consultar um profissional de saúde
Antes de iniciar qualquer tratamento com Canabidiol, a exigência é conversar com um profissional de saúde qualificado.
Um médico especializado pode avaliar as suas necessidades individuais, o seu quadro clínico e determinar se este tratamento se adequa ao seu perfil.
O uso inadequado de CBD, sem supervisão, pode levar ao consumo excessivo, especialmente quando se busca alívio rápido para condições como ansiedade ou insônia.
Além disso, profissionais de saúde podem ajudar a monitorar interações medicamentosas que o Canabidiol pode ter com outros tratamentos, prevenindo complicações.
2. Escolher produtos de qualidade
Outro cuidado é garantir que o produto de Canabidiol que você está consumindo seja de alta qualidade e certificado.
O mercado de CBD ainda está em expansão e, infelizmente, há muitas marcas que oferecem produtos sem a devida regulamentação ou com composições duvidosas.
Produtos de baixa qualidade costumam conter níveis inadequados de THC, substâncias tóxicas ou serem ineficientes.
Escolher um produto confiável garante que você estará consumindo exatamente o que o rótulo promete, sem surpresas desagradáveis que podem comprometer a sua saúde.
Então, opte por marcas que ofereçam testes laboratoriais de terceiros, que garantam a transparência sobre a concentração de CBD e a ausência de contaminantes.
3. Monitorar os efeitos
O CBD pode atuar de maneira diferente de pessoa para pessoa. Por isso, é necessário prestar atenção a como você se sente após o consumo.
Se você notar que precisa de doses cada vez maiores para alcançar o mesmo efeito, isso pode ser um sinal de que o uso está sendo inadequado.
É por isso que o monitoramento é tão importante. Ele também ajuda a identificar possíveis efeitos colaterais, como sonolência excessiva ou problemas gastrointestinais, que podem surgir com o uso incorreto.
A melhor dica é, então, manter um diário de consumo, anotando as doses, horários e os efeitos percebidos. Essa prática também facilita o diálogo com seu médico, permitindo ajustes na dosagem e evitando riscos ocultos.
4. Não realizar a automedicação
Um dos erros mais comuns no uso do Canabidiol é a automedicação. Muitas pessoas, ao enfrentarem problemas de saúde, podem sentir-se tentadas a comprar CBD sem consultar um profissional de saúde.
No entanto, essa prática tem sérios riscos, pois cada organismo reage de maneira única ao Canabidiol, e a dosagem correta varia conforme a condição de saúde, peso corporal, metabolismo e outros fatores.
Sem a orientação adequada, há o risco de superdosagem ou subdosagem, podendo comprometer o efeito terapêutico e até causar desconforto.
Do mesmo modo, o uso descontrolado, sem ajustes profissionais, pode induzir ao consumo exagerado com o tempo, aumentando o risco de dependência psicológica, já que a pessoa pode sentir que precisa de altas doses para obter alívio.
5. Combinar com terapias comportamentais
O Canabidiol pode ser uma ferramenta valiosa no manejo de diversas condições, mas não deve ser visto como a única solução.
Normalmente, os profissionais de saúde recomendam combiná-lo com outros medicamentos ou terapias comportamentais, como a terapia cognitivo-comportamental (TCC) ou práticas de mindfulness.
Essas abordagens ajudam a pessoa a desenvolver habilidades para lidar com os problemas de forma mais ampla, reduzindo a dependência de soluções imediatas.
No caso de ansiedade, por exemplo, a terapia comportamental pode ensinar técnicas de enfrentamento que melhoram a qualidade de vida no longo prazo, enquanto o Canabidiol oferece alívio imediato dos sintomas mais intensos.
Essa combinação cria um equilíbrio entre o tratamento dos sintomas e a busca por mudanças profundas no comportamento.
Dessa forma, é possível evitar que o Canabidiol seja visto como a única solução, diminuindo a probabilidade de dependência psicológica.
6. Atenção a interações medicamentosas
O Canabidiol pode alterar a forma como certos medicamentos são metabolizados no corpo, especialmente aqueles que utilizam as enzimas do fígado para serem processados, como anticonvulsivantes, anticoagulantes e alguns antidepressivos.
Essas interações podem aumentar ou reduzir sua eficácia, o que, em alguns casos, pode ser perigoso. Por isso, é imprescindível informar ao seu médico sobre todos os remédios que você está utilizando antes de iniciar o tratamento.
O acompanhamento regular e exames laboratoriais podem ser necessários para monitorar os níveis desses medicamentos no sangue e garantir que o uso concomitante de CBD não traga complicações.
Além do mais, o médico pode ajustar as doses do Canabidiol ou dos outros remédios, caso seja necessário.
7. Realizar acompanhamento regular
O corpo pode mudar ao longo do tempo, seja em resposta a tratamentos, seja devido a outros fatores como envelhecimento ou alterações na saúde geral. Com isso, a dosagem e a necessidade de CBD também podem variar.
Consultas periódicas permitem que o médico ajuste o tratamento de acordo com suas necessidades e observe quaisquer efeitos adversos ou sinais de que o uso está se tornando inadequado.
Isso também possibilita uma avaliação mais ampla que considera outras opções de tratamento ou mudanças na rotina, como ajustes na dieta ou incorporação de novos hábitos, que podem potencializar os efeitos do CBD.
Manter esse diálogo contínuo com um profissional de saúde é a melhor forma de garantir que o Canabidiol seja utilizado de maneira eficiente, sem correr riscos desnecessários, e assegura que o foco permaneça no bem-estar geral.
A Cannabis medicinal no tratamento de dependência de outras drogas
Cada vez mais estudos reforçam que o uso do CBD pode ajudar a suavizar a transição para uma vida sem drogas, fornecendo um suporte tanto no aspecto físico quanto emocional.
Embora não substitua o acompanhamento médico e terapêutico, pode ser uma contribuição importante para quem está enfrentando esse difícil processo de recuperação.
Quando uma pessoa decide parar o uso de substâncias como opioides, cocaína ou álcool, o corpo entra em um estado de desequilíbrio, o que pode desencadear uma série de sintomas físicos e psicológicos intensos.
Náuseas, insônia, dores musculares e ansiedade são apenas alguns dos desafios enfrentados.
De acordo com um estudo realizado em 2020, as evidências indicam que o CBD é uma terapia promissora para o tratamento da dependência de cocaína.
Ele tende a atenuar os efeitos de recompensa da cocaína, consumo de cocaína, respostas comportamentais e ansiedade.
Além disso, o CBD possui propriedades anti-inflamatórias e neuroprotetoras, o que pode ser útil para aliviar dores e desconfortos físicos que acompanham a abstinência desta substância.
Já outro estudo publicado na revista Addiction aponta que o uso de Cannabis no tratamento de abuso de álcool permitiu uma redução dos sintomas da abstinência de álcool em comparação com aqueles que passaram por este período sem o tratamento com Cannabis medicinal.
Ainda sobre alcoolismo, temos uma pesquisa publicada na Addiction Biology que aponta como o CBD auxilia na redução do consumo de álcool e melhora a motivação do paciente, tendo resultados mais positivos do que os medicamentos convencionais utilizados para este tipo de transtorno.
Como iniciar um tratamento complementar com a Cannabis medicinal?
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) regulamenta a prescrição de derivados da Cannabis no Brasil desde 2015, permitindo que médicos prescrevam esses produtos para tratar diversas condições de saúde.
O uso medicinal da Cannabis, no entanto, é rigorosamente controlado. Sendo assim, o órgão exige que a prescrição seja feita exclusivamente por profissionais com registro ativo no Conselho Federal de Medicina.
Portanto, iniciar um tratamento complementar com a Cannabis medicinal envolve uma consulta médica.
O processo começa com a avaliação das necessidades individuais do paciente, levando em consideração seu histórico clínico, os sintomas atuais e a resposta a tratamentos anteriores.
O médico definirá a dosagem ideal e a forma de administração mais adequada – que pode variar entre óleos, cápsulas ou sprays.
O acompanhamento contínuo também é importante, pois a dosagem pode ser ajustada ao longo do tratamento para garantir a entrega dos efeitos esperados.
E para encontrar médicos prescritores de Cannabis medicinal, o portal Cannabis & Saúde oferece uma plataforma de agendamento de consultas que facilita o acesso a profissionais qualificados.
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Conclusão
Ainda que o Canabidiol não vicie e tenha se mostrado seguro, ainda é necessário que seu uso seja feito com orientação adequada, especialmente para quem busca tratamento terapêutico para os sintomas de abstinência.
Mesmo não causando dependência, o consumo deve ser responsável para garantir que os resultados esperados sejam atingidos sem complicações.
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