Antes de começar, profissional deve buscar livros, associações e colegas da área que ajudem a entender as possibilidades dos medicamentos
Por Rogério Godinho
O sul-mato-grossense Wilson Lessa levou um ano para tomar coragem e prescrever canabidiol (CBD) pela primeira vez. Descobriu em 2017, quando já havia se mudado para Roraima, mas só em 2018 receitou para o primeiro paciente. Um dos motivos para a demora é que falta informação. “Não há no Brasil boa oferta de cursos especializados ou pós-graduação, está começando agora”, diz o psiquiatra Lessa, formado na Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). “Para se aprimorar, ainda tem que achar conhecimento por conta própria.”
Em geral, isso significa ler artigos e livros, boa parte disponível somente em outros idiomas, principalmente o inglês. Entre as opções publicadas em português no Brasil, Lessa indica o livro do médico formado em Harvard Gregory Smith. É o “Desvendando o Sistema Endocanabinóide através do CBD”, que explica como funciona o CBD e como usá-lo no tratamento de diversas enfermidades.
O aprendizado não precisa ser solitário. O médico pode procurar eventos de associações médicas diversas, além das especializadas como a Sociedade Brasileira de Estudos da Cannabis (SBEC). Nessas ocasiões, é possível encontrar informação e grupos – existentes ou que podem ser criados – com colegas que trocam informação virtualmente. “Tem que procurar fazer parte disso para não ficar isolado”, diz Lessa.
O carioca Eduardo Faveret seguiu caminho semelhante na busca por informação e hoje orienta que o médico interessado no CBD como medicamento procure ter tanto um embasamento geral como um mais específico. Ou seja, busque cursos e informações gerais sobre o canabinóide, mas também se aprofunde no efeito na doença específica que será tratada, seja epilepsia, doença crônica ou outra. Além disso, sugere que se procure um consultor, alguém que já tenha feito esse caminho e que possa passar dicas mais práticas. Faveret está preparando um guia para os médicos que estão começando e espera lançar ainda este ano. Ele é neuropediatra formado na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
Para quais doenças prescrever?
A preparação específica do médico varia de acordo com a enfermidade. “Cada um tem uma experiência diferente”, diz Faveret, que costuma receber pacientes encaminhados de outros médicos que ainda têm receio de prescrever e preferem encaminhar para quem tem mais experiência. Nesse cenário, o mais comum é que o paciente já chegue predisposto a aceitar o medicamento e perguntando a opinião do médico sobre aquele tipo de tratamento específico. “Precisamos ficar atentos e sensíveis ao que se ouve no consultório”, diz o carioca.
Diante da demanda, os médicos costumam prescrever o CBD para diversas patologias, como autismo, epilepsia, esquizofrenia, ansiedade, parkinson, alzheimer e dores crônicas em geral. No caso de Lessa, baseado em Boa Vista (RR), as prescrições mais comuns são para casos de autismo e fibromialgia com dores crônicas.
Por enquanto, as prescrições devem ser sempre compassivas. Ou seja, sem registro na Agência Nacional de Vigilância em Saúde (Anvisa), o medicamento pode ser prescrito para pacientes sem alternativa terapêutica satisfatória com produtos registrados no país. Para isso, é preciso uma autorização para que o paciente possa comprar o medicamento. Se o CBD for registrado na Anvisa, o processo será mais simples e o paciente poderá comprar diretamente na farmácia.
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Tanto Faveret como Lessa prescrevem diariamente o CBD. No caso do carioca, chega a ser três ou quatro vezes por dia, um número que era maior antes da pandemia do coronavírus. Para boa parte dos pacientes o medicamento chega mesmo a ter uma aura positiva e especial,
pois seria um “produto natural, por isso muito potente”. De acordo com Faveret, essa visão pode até reforçar o efeito. Existe também a percepção de que o CBD terá menos efeitos adversos do que alternativas para aquela doença ou sintoma.
De acordo com os médicos, os pacientes resistentes são raros. Por exemplo, religiosos. Ou pais, quando o paciente é criança, e acabam respondendo que preferem tentar outras coisas antes. Dizem que não são totalmente contra, mas que vão estudar e acompanhar melhor o assunto.
Nessas horas, Lessa ainda se surpreende que tanta gente tome medicamentos fortes como Rivotril, sem refletir tanto sobre dependência ou efeitos colaterais. “Parte da desmistificação do canabidiol passa por mostrar o outro lado dessas medicações que são prejudiciais e mesmo assim são tratadas com banalidade.”
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