Uma pesquisa realizada pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) está trazendo luz ao tema do burnout parental no Brasil. Coordenado pela pesquisadora Ana Letícia Senobio dos Santos, sob a orientação da Profa. Dra. Marcela Mansur-Alves, o estudo faz parte de uma série de investigações do Laboratório de Avaliação e Intervenção em Saúde (LAVIS).
A pesquisa busca entender as condições e fatores de risco que levam ao esgotamento emocional na parentalidade, abrangendo diferentes contextos, incluindo pais de crianças neurodiversas e tem como base observações feitas em atendimentos psicoterapêuticos durante a graduação da pesquisadora.
“Durante meus atendimentos, percebi que muitas mães apresentavam exaustão, depressão e ansiedade. Esse quadro me fez questionar como poderia contribuir para ajudar”, explica. A partir dessa observação, Ana Letícia decidiu investigar, focando especialmente em grupos vulneráveis, como mães de crianças com transtornos do neurodesenvolvimento.
Os resultados preliminares do estudo sugerem que o burnout parental já é uma realidade entre mães e pais brasileiros, especialmente aqueles em situações socioeconômicas vulneráveis ou que cuidam de crianças neurodiversas.
“Embora nosso estudo ainda seja exploratório, os resultados indicam que grupos como mães, pais de crianças atípicas e aqueles em situações de vulnerabilidade social apresentam maiores níveis de burnout parental”, relata Ana Letícia. Ela destaca que o estresse parental está diretamente relacionado a transtornos como depressão e ansiedade, elevando o risco de adoecimento mental nessas populações.
Sintomas mais comuns do burnout parental
Entre os sintomas identificados em mães e pais que vivenciam burnout parental, a exaustão é o mais proeminente.
Ana Letícia descreve ainda outros sintomas importantes, entre eles estão:
- Sensação de extremo cansaço em relação ao papel de mãe ou pai;
- Percepção de que a experiência de parentalidade mudou negativamente com o tempo;
- Dificuldade em sentir prazer nas atividades relacionadas ao cuidado dos filhos;
- Distanciamento emocional dos filhos.
“Os sintomas são semelhantes entre pais de crianças típicas e neurodiversas. Um dos mais intensos é a exaustão extrema, além de níveis elevados de depressão e ansiedade. Em alguns casos, os pais conseguem cumprir apenas as tarefas básicas de cuidados, como alimentação e higiene, mas têm dificuldade em ir além.”
Perfis mais vulneráveis
Ana Letícia destaca que as mães são mais suscetíveis, especialmente quando pertencem a outros grupos de risco. “Mães de crianças neurodiversas, em situação de vulnerabilidade socioeconômica ou que fazem parte de famílias homoafetivas estão entre as mais suscetíveis ao burnout parental”, afirma.
Ela explica ainda que as pressões sociais para corresponder a um ideal de maternidade, somadas à responsabilidade desproporcional pelos cuidados domésticos e pela criação dos filhos, são fatores que intensificam o esgotamento dessas mulheres.
“Em mães, é comum também que vivenciem o sentimento de culpa e solidão por estarem vivenciando a condição. É importante ressaltar que não é culpa delas e que não precisam passar por isso sozinhas, busquem ajuda“, alerta.
Burnout parental em mães e pais de crianças neurodiversas
De acordo com o estudo, pais de crianças neurodiversas, como aquelas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) ou Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH), enfrentam desafios específicos relacionados à condição de seus filhos. Esses desafios incluem:
- Dificuldades no processo de diagnóstico;
- Acesso limitado a tratamentos devido a restrições financeiras ou geográficas;
- Adaptação e integração escolar;
- Demandas de uma rotina intensa;
- Limitações sociais;
- Tensões no relacionamento conjugal;
- Preocupações com o futuro.
Essas dificuldades podem aumentar os níveis de estresse e elevar a vulnerabilidade desses pais ao burnout parental. Diante disso, o estudo investigou se há diferenças nos níveis de burnout parental entre pais de crianças neurotípicas e pais de crianças neurodiversas.
Os resultados mostraram que mães e pais de crianças neurodiversas (M=2,92) apresentam níveis significativamente mais elevados de burnout parental em comparação com mães e pais de crianças neurotípicas (M=2,22), com diferença estatisticamente significativa (p<0,001) e um tamanho de efeito médio (r=0,28).
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Como posso identificar o burnout parental?
“É fundamental que mães e pais que suspeitam estar enfrentando o burnout parental busquem apoio psicológico. Com a ajuda de um(a) profissional, é possível trabalhar na redução do estresse por meio de práticas de relaxamento, reorganização da rotina, desenvolvimento de habilidades parentais e até mesmo na revisão de crenças e expectativas sobre a maternidade e paternidade”, explica Ana Letícia.
Ainda de acordo com a especialista, o tratamento varia de acordo com cada situação, mas essas são algumas das estratégias que podem ser utilizadas tanto no tratamento quanto na prevenção. Além disso, participar de grupos de apoio pode ser muito benéfico. “É essencial que esses pais saibam que o burnout parental é uma condição tratável e que não é culpa deles. Eles não precisam enfrentar isso sozinhos”, diz.
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Para quem deseja se aprofundar no tema, a UFMG disponibilizou uma cartilha gratuita com os resultados apresentados, que pode ser acessada aqui. Além disso, o material oferece orientações e perguntas que podem ajudar mães e pais a identificarem se estão vivenciando o burnout parental.
“Vale destacar que o material não tem o objetivo de fornecer um diagnóstico, mas sim de oferecer um direcionamento. Caso se identifiquem com os sinais descritos, é fundamental buscar a ajuda de um profissional de saúde mental, como psicólogos, para avaliação e tratamento adequado”, finaliza Ana Letícia.