Ministro André Mendonça pede mais tempo para analisar o processo, mas Suprema Corte já formou maioria para diferenciar usuário de traficante
O julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF), que pode aprovar a descriminalização do porte de maconha para consumo pessoal, já tem placar favorável para determinar uma quantia mínima que vai distinguir usuário de traficante.
Até agora, dos 11 ministros que compõem a corte, cinco interpretaram como inconstitucional o artigo 28 da Lei de Drogas (11.343/2006) que criminaliza o porte de maconha para consumo pessoal no Brasil.
São eles: o relator, Gilmar Mendes, a presidente do STF, Rosa Weber e os ministros Edson Fachin, Luís Roberto Barroso e Alexandre de Moraes.
Zanin se isola no voto contra
Por enquanto, apenas o ministro – recém empossado e indicado pelo presidente Lula – Cristiano Zanin votou para manter a lei como está, incluindo no dispositivo a quantidade mínima de 25 gramas para diferenciar traficante de usuário.
Com o voto de Zanin, a mais alta Corte do pais formou consenso, para definir um critério objetivo para estabelecer quanto o usuário de maconha pode portar sem ser criminalizado por isso. Essa quantidade limite ainda está em debate e pode variar de 25 a 100 gramas.
Agrava o problema
“De um lado o sistema judicial penal se torna prejudicial e vem permitindo um encarceramento maciço. De outro, ao declarar inconstitucionalidade do artigo 28 da Lei 11.343, poderia agravar o problema, sem disciplinar a origem das drogas”, argumentou.
Segundo o magistrado, o Congresso, ao editar a Lei de Drogas, já afastou as penas privativas de liberdade. No entanto, na visão do ministro, o artigo 28 é o único que estabelece critérios – ainda que não objetivos – para que determinar o que é tráfico.
“Não houve descriminalização, mas despenalização das penas privativas de liberdade. Essa despenalização não tece o condão de solucionar ou melhorar a situação do problema de drogas no país”, sustentou Zanin.
Apesar de reconhecer que as pessoas pobres, negras e de baixa escolarização não recebem o benefício da despenalização, para o ministro, a descriminalização do porte pode colocar em risco a vida do usuário. Por isso, o magistrado defende a manutenção do texto original da lei.
André Mendonça pede vista
Já o ministro André Mendonça pediu mais tempo para analisar a ação que tramita no Supremo desde 2011 e entrou na pauta de julgamento em 2015. Pelas regras da Corte, o ministro tem até 90 dias corridos para devolver o processo.
Além de Mendonça, ainda faltam votar os ministros Nunes Marques, Luiz Fux e Cármen Lúcia.
Presidente do STF adianta voto
Com receio de que a ação não seja liberada antes de setembro, quando se aposenta, a presidente do STF, ministra Rosa Weber adiantou o voto.
Inicialmente, a presidente do STF disse que iria seguir a interpretação do relator, Gilmar Mendes, para que a descriminalização abarcasse o porte de todas as drogas. Mas como o relator ajustou o voto para seguir a maioria, Weber também foi pelo mesmo caminho
“Nessa temática, talvez seja mais adequado ficarmos restrito à maconha. Acho que precisamos dar um passo à frente”, afirmou a presidente da Corte.
Visão do inferno
Para justificar o voto, a ministra disse que tem visitado várias penitenciárias em todo país e a situação, segundo ela, é degradante.
“É a visão do inferno! Nossas prisões estão cheias de meninos e meninas, na maioria negros e pobres. A maior parte está lá em função do tráfico”, lamenta a magistrada.
Para a ministra, a criminalização da maconha potencializa os estigmas que recaem sobre o usuário e não ajuda no processo de tratamento do dependente químico. “A ideologia da Lei de Drogas era resolver a dependência química por meio do Sistema de Saúde”, lembrou.
Lei deve ser igual para todos
Sobre a suposta invasão de competência de poderes, Weber defendeu a Corte, afirmando que não é intenção do Supremo legislar sobre o assunto, mas apenas contribuir para que a lei seja aplicada de forma coerente e justa.
De acordo com a ministra, há pelo menos 7.769 processos similares suspensos – tramitando nas instâncias de primeiro e segundo grau – à espera de uma decisão do STF. O caso, quando julgado, terá repercussão geral reconhecida, ou seja, valerá para todo o Judiciário.
Tensão com o Congresso
Na sessão dessa quinta-feira, o relator do processo, ministro Gilmar Mendes, ajustou o voto, para que a descriminalização do porte de drogas fique restrita à maconha. Em 2015, Mendes defendeu em seu voto que a não criminalização do usuário abrangesse todas as drogas.
Ao ler o novo entendimento, Mendes fez questão de exaltar que, ao colocar o assunto em pauta, o STF não invade a competência de legislar do Congresso Nacional, já que foram os parlamentares que optaram por não penalizar com cadeia o usuário, ao aprovar a lei.
Descriminalizar só a maconha, não resolve
“Não existe exame constitucional apolítico. O direito constitucional não se impõe sozinho (…). Nos limitemos à Cannabis Sativa, que é objeto desse recurso. Apesar de colocar o tema pela janela e ele volta por outra variante”, alertou o relator.
Mendes disse que conversou com os presidentes da Câmara e do Senado para mitigar tensão.
O Congresso despenalizou em 2006
“O Rodrigo Pacheco estava preocupado com essa suposta invasão de competências ao Legislativo. Conversa semelhante eu tive com o presidente Câmara, Arthur Lira, para esclarecer o que fica claro no voto do Moraes. Foi o Congresso que despenalizou o usuário”.
O relator sustentou que, muito embora a Corte caminhe para não criminalizar quem porta maconha, ainda haverá sansão administrativa para quem for pego portando a planta.
100 gramas?
Para o ministro Luís Roberto Barroso, o ideal seria fixar a quantidade mínima de 100 gramas para o porte pessoal, para resolver o problema do hiper encarceramento de jovens primários.
“Não se trata de apoio ao consumo, mas a melhor forma de tratar o assunto. As drogas ilícitas são uma coisa ruim, devemos trabalhar para evitar o consumo de drogas”, defendeu o magistrado.
O tráfico tem que ser combatido com inteligência
Barroso lembrou ainda que o julgamento não trata sobre a legalização das drogas como alguns afirmam. “Para quem acha que é importante reprimir, há outro caminho, que certamente não é o de prender menino pobre de periferia. O caminho seria, e acho que todos estão de acordo, monitorar grandes carregamentos, seguir o dinheiro e policiar as fronteiras”, justificou.
De acordo com Barroso, o tema delicado – em várias partes do mundo – tem sido pacificado pelo Judiciário. “Não há invasão de competência. Quem prende são os juízes, mas quem julga os Habeas Corpus somos nós”, lembrou.
Para os ministros favoráveis à não criminalização do usuário, é preciso mitigar o preconceito que orbita em torno da temática, por meio de ações que reduzam os danos e sejam preventivas aos riscos.
Saiba mais sobre a ação
O STF retomou o julgamento do Recurso Extraordinário 635.659 – engavetado há 8 anos – interposto a favor de Francisco Benedito de Souza, que questiona a constitucionalidade do artigo 28 da chamada Lei de Drogas (11.343/2006).
O dispositivo criminaliza o usuário que compra, guarda, mantém em depósito ou transporta entorpecentes para consumo pessoal no Brasil. Hoje, a pena varia de advertências, à prestação de serviços à comunidade ou medidas educativas.
Cabe ao Estado punir quem age em prejuízo próprio?
Provocada pela Defensoria Pública de São Paulo, a Suprema Corte vai analisar se o referido artigo contraria a Constituição Federal e se cabe ao Estado punir alguém que age em prejuízo próprio.
Esses são os principais argumentos apresentados pela Defensoria Pública. Para o órgão, a criminalização de condutas que dizem respeito à intimidade e à vida privada fere os direitos resguardados pelo artigo 5º da Lei Maior, a Constituição.
Relembre o caso
Francisco Benedito de Souza foi condenado a prestar serviços comunitários depois de ser flagrado com três gramas de maconha, na cela onde já cumpria pena, por porte de arma de fogo.
O julgamento, que teve início em 2015, sofreu uma interrupção no mesmo ano, com um pedido de vista do então ministro Teori Zavascki, que faleceu num acidente aéreo em 2017.
Seu substituto, o ministro Alexandre de Moraes, liberou a ação para julgamento em 2018. Mas o processo continuou na gaveta.
Na opinião de especialistas, a Suprema Corte estaria tentando evitar mais um embate com o governo do então presidente de Jair Bolsonaro.
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