Vinda de uma família de médicos, na maioria cirurgiões, desde a adolescência a psiquiatra Indira de Paula acreditava que esses seriam os passos a serem seguidos. Até que se deparou com a realidade dos pacientes, ainda durante a faculdade.
“Muitas vezes os pacientes assistidos nos ambulatórios das especialidades tinham questões emocionais que o atravessavam até o adoecimento físico. Antes de tudo, eu sentia im incômodo muito grande de perceber que não havia espaço para adentrar as questões da subjetividade, da relação mente e corpo.”
Quando chegou a hora de estudar Psiquiatria, já no 8º período da Graduação, o incômodo virou certeza. “Consegui entender que a cirurgia não fazia o menor sentido dentro da minha personalidade e do que eu me via fazendo na Medicina.”
Depois que se formou em Medicina, em Vitória (ES), em 2012 seguiu para o Rio de Janeiro, para a Residência em Psiquiatria. “A gente tinha uma emergência psiquiátrica de porta aberta no centro. Chegava para a gente todo perfil de pacientes.”
“Nesse primeiro momento, eu tive contato com essa Psiquiatria mais hegemônica, tradicional, mas que vinha numa configuração dos moldes da reforma psiquiátrica, buscando cuidar em liberdade, entendendo que a internação seria o último recurso a se tentar.”
A Osiquiatra e a Cannabis
Ainda durante a Residência, conheceu Rafael Aguilar, seu companheiro. Também psiquiatra, ele começou a se interessar pelos estudos sobre o uso terapêutico da Cannabis medicinal ainda na faculdade, apesar de o assunto ser pouco comentado na Academia.
“De fato, foi ele que começou prescrevendo. Confesso que fui um pouquinho mais medrosa e cautelosa.”
Até que, em uma viagem de família, eles foram para o Uruguai. Na época, o país vizinho discutia a descriminalização da Cannabis. “Isso me interessou muito. Comecei a estudar de forma autônoma e a trocar figurinhas com o Rafael.”
Conforme a discussão sobre a Cannabis medicinal também chegou ao Brasil, o acesso foi facilitado e começaram a surgir cursos de pós-graduação, focados nos canabinoides. Então, a psiquiatra passou a estudar e, em 2021, começou a prescrever.
“Fui observando diversos resultados, como a diminuição da carga medicamentosa de alguns pacientes, que não mais toleravam certos efeitos adversos de psicofármacos de uso crônico. Além disso, também havia a dificuldade de adesão ao tratamento convencional, por conta das reações adversas.”
“ Também foi possível realizar transição das prescrições, associando a Cannabis medicinal com a farmacoterapia alopática. Assim, em certos casos, houve a redução progressiva dos fármacos para aqueles pacientes já estabilizados.”
Além do emocional
Atualmente, seu consultório, que divide com o companheiro, já conta com mais de 200 pacientes fazendo o uso de Cannabis medicinal. “Os resultados e as situações clínicas são as mais diversas possíveis.”
“Em idosos com quadro demencial avançado que estavam usando o remédios tradicionais, consigo fazer uma redução da carga medicamentosa e manter a estabilidade com a Cannabis medicinal. Eles conseguem ter algum grau de autonomia recuperada”
“Pacientes ansiosos, que não aceitam o uso da alopatia e preferem buscar tratamentos alternativos, também costumam ter bom resultado. Pacientes com Burnout, pacientes com transtorno de movimento como, por exemplo, síndrome de Tourette. Com quadro depressivo e até, aqueles que sentem dores crônicas”
“Venho notando melhora, não somente no processo emocional, mas também nos quadros de dor. Mas, para cada situação clínica, a gente vai precisar fazer o manejo e escolher o produto da Cannabis que seja mais indicado para aquele paciente.”
Individualidade e abrangência
“A gente tem hoje óleos que são ricos em CBN, que é um dos fitocanabinoides mais eficazes no tratamento de insônia. Tem óleo com concentração maior do CBG que, com o CBD, faz o efeito analgésico mais interessante. Essa escolha tem sido direcionada, a partir das manifestações clínicas e a partir do que a gente tem como evidência científica.”
Segundo Indira, o que mais lhe chama atenção é a tolerabilidade e ação abrangente da Cannabis medicinal. “A gente observa que nos paciente polissintomaticos, com a Cannabis medicinal, a gente consegue contemplar esses múltiplos sintomas de forma mais efetiva.”
“Ela vai ativar aquilo que precisa de fato ser modulado e melhorado. Não vai agir naquilo que não é necessário, mas de forma singular à necessidade daquele órgão e sistema.”
“Às vezes, com o fármaco convencional, a gente vai melhorar os sintomas, mas vão aparecer outros, do efeito colateral. Com a Cannabis, acho interessante que a gente não fica tratando o paciente por partes. É uma ferramenta com a qual a gente consegue ter uma abordagem mais integral do cuidado, promovendo a integração mente-corpo, através do sistema endocanabinoide.”
“Pacientes com quadros de depressão e ansiedade, que são os transtornos mais prevalentes na nossa população, têm muitas queixas cognitivas, dificuldade de concentração, memória falha, e, com a Cannabis, é possível ter uma melhora, que vai além dos sintomas dos sintomas psíquicos. “
Psiquiatra do futuro
Por todos esses motivos, a psiquiatra acredita que a Cannabis terá cada vez mais espaço dentro dos consultórios.
“Eu costumo brincar que o futuro é hoje. No campo da Psiquiatria, a gente tem muito ainda a descobrir sobre o potencial terapêutico da Cannabis medicinal, mas aquilo que a gente já tem de dados é bem consistente e indica a possibilidade de uso dessa ferramenta de forma segura.”
No entanto, ela alerta para a necessidade de capacitação e uso responsável por parte dos médicos. “Não adianta achar que eu vou prescrever para todo mundo e vou ter o mesmo resultado. A gente precisa individualizar esse cuidado, porque existe singularidade não só no campo psíquico, mas no campo da metabolização do fitoterápico.”
“Precisamos nos atualizar permanentemente, para saber fazer o bom uso deste recurso. Indicar quando necessário, através de critérios clínicos, e entendendo seus possíveis benefícios e os riscos. Não dá para ser uma panaceia.”
Psiquiatra, orientação e cuidado
Em quase três anos prescrevendo Cannabis medicinal, a psiquiatra conta que costumava ficar mais tensa com os questionamentos sobre a Cannabis. “Hoje eu trago para o humor e explico para o paciente.”
“Quando o paciente fala que é a mesma coisa que fumar um baseado, eu oriento que não é a mesma coisa. A Cannabis medicinal tem propriedades exclusivamente terapêuticas. Não tem o mesmo efeito da maconha fumada. O que a gente prescreve é o extrato dessa planta, com uma concentração definida dos fitocanabinoides.”
“Nosso trabalho é também educar, orientar e ouvir as dúvidas dos pacientes. Quando ele sai com dúvida do consultório, pode ser que ele nem arrisque tentar aquela medida, justamente por conta do preconceito ou pelo desconhecimento.”
“A orientação faz parte da abordagem na consulta quando a gente inicia uma terapia, seja qual for. Com a Cannabis também precisa ser assim.”
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