As Olimpíadas do Japão terminaram neste domingo e, além das imagens eternizadas de atletas emocionados com suas medalhas, uma cena que ficou marcada em Tóquio foi da superestrela Simone Biles desistindo de competir em nome da própria saúde. A ginasta de 24 anos acabou ganhando um bronze depois, mas o caso dela trouxe uma discussão ampla sobre os desafios de saúde mental enfrentados por esportistas de alto desempenho.
Ela sofre uma condição mental chamada “twisties”, quando o atleta perde a noção de onde o corpo está no ar. Mas além dessa condição específica, Biles já sofreu assédio sexual no passado e, no Japão teve de lidar ainda com o julgamento moralista das redes sociais por conta da sua desistência, fato que pode agravar ainda mais a saúde mental de qualquer esportista.
Para a coach esportiva Nell Salgado, que trabalha com atletas profissionais e olímpicos há 13 anos, o caso da Simone Biles é representativo por conta do nível de sucesso e competitividade da atleta.
“É muito importante ela abrir essa discussão porque o atleta é construído para não dizer que sente medo. Ele não diz que sente ansiedade, pressão, depressão. Ao longo da minha vida profissional, lidei com atletas que passaram por questões gravíssimas de depressão, trabalhando sempre em parceria com grandes profissionais da psiquiatria e psicologia, porque o coach não trata esse tipo de patologia”.
“Preparação mental é tão fundamental quanto à física”
“Não adianta eu trabalhar só performance, se o problema às vezes é uma questão de saúde mental. Já ouvi inúmeras vezes atletas dizendo estarem com vergonha de ficar depressivo, com ansiedade, com síndrome de pânico. Não foi nem um nem dois. E atletas que inclusive já tentaram contra a própria vida, e ninguém fala disso. É um tabu”, denuncia.
“E as pessoas acham que o atleta está blindado. Que ele é programado para lidar com qualquer situação. Por isso, que a preparação mental é fundamental, assim como é a preparação física, alimentar, tática, fisiológica. Isso precisa ser colocado na mente dos atletas, não só como questão de resultado, mas de saúde mesmo”, conclui.
Canabidiol surge como alternativa
Uma das terapias promissoras para os atletas é o canabidiol, um derivado da Cannabis sem efeitos psicotrópicos e poucos efeitos colaterais, mas de imenso valor medicinal. Por conta dessas propriedades, cada vez mais ligas esportivas estão liberando seu uso. As Olimpíadas de Tóquio inclusive foram as primeiras em que o CBD não é mais considerado doping.
Ao longo das últimas semanas, o portal Cannabis & Saúde produziu reportagens e lives sobre o uso do canabidiol no controle de dores, lesões e recuperação muscular de atletas – amadores e profissionais. Mas segundo a psiquiatra Ana Gabriela Hounie, pesquisadora e prescritora pioneira de canabinoides no Brasil, o CBD também é importante para tratar a saúde mental dos atletas.
“Do ponto de saúde mental, ele reduz a ansiedade, melhora o sono e também ajuda na depressão. Isso porque o canabidiol atua nos mesmos receptores dos antidepressivos. Ele bloqueia a dopamina e isso melhora a ansiedade. Como o CBD tem ação inibitória sobre os receptores canabinóides, ele inibe a produção de dopamina, noradrenalina, diminui a pressão e o batimento cardíaco, que estão justamente relacionados à ansiedade”.
Caso do maratonista olímpico Daniel Chaves, que representou o Brasil nas Olimpíadas de Tóquio. O corredor já passou por um período delicado de depressão e quase desistiu de ser um atleta. Mas ele conta que a Cannabis o ajuda, tanto na parte física, como emocional.
“É em ambos os aspectos. Eu digo que quando estou bem mentalmente, o treino físico rende muito mais! E o CBD não poderia ser melhor para isso: me deixa equilibrado para ter um foco mental na hora do treinamento. Isso, fora a parte da recuperação física, que é muito confortante no pós-treino”, contou.
Daniel Chaves teve e continua tendo acompanhamento médico no tratamento com canabidiol. A coach Nell Salgado salienta a importância de se se consultar com um médico antes de iniciar esse tipo de tratamento. Ela alerta inclusive que só o médico pode tratar a saúde mental dos atletas.
“É uma irresponsabilidade de qualquer coach dizer que trata da saúde mental. Hoje muitos profissionais estão assediando atletas através das redes sociais oferecendo esse trabalho. Então é importante conscientizar esses atletas para que isso não seja feito de qualquer maneira. Para eles não entregarem a carreira na mão de qualquer pessoa. Profissional desqualificado existe em qualquer área, mas sendo essa área a saúde mental, o risco é incalculável”.