Às vésperas da votação do Projeto de Lei 399/15, que legaliza o plantio de Cannabis para fins medicinais e industriais no Brasil, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL) promoveu uma comissão geral no plenário com 42 convidados pelos parlamentares, dentre eles Sidarta Ribeiro.
Cada um teve 3 minutos para a fala, e o que se viu foram os favoráveis defendendo a ciência e apelando às histórias emocionantes de pacientes e as presenças contrárias desvirtuando o tema para guerra às drogas e dependência química.
Uma das falas mais esperadas foi a do neurocientista Sidarta Ribeiro. Disse ele que “em poucos anos vamos tremer de vergonha por termos proibidos por tanto tempo a maconha medicinal. A maconha é remédio há milênios e todos os seres humanos possuem substâncias semelhantes às da planta”, se referindo ao nosso sistema endocanabinoide.
O cientista argumentou que o debate não é sobre a legalização da Cannabis medicinal, pois ela já está legalizada para as pessoas com poder aquisitivo. A discussão, no argumento de Ribeiro, é dar acesso amplo aos pacientes que mais precisam e não tem condições de pagar pelo remédio da farmácia ou importado.
Levar o debate ao plenário foi um pedido dos parlamentares opositores ao PL, embora a votação deva acontecer somente dentro da comissão especial. O parecer favorável está nas mãos do relator, Luciano Ducci (PSB-PR), que pediu mais alguns dias para algumas modificações ao projeto. Ele deve ser votado nas próximas duas semanas.
A comissão geral foi dividida em dois momentos: o primeiro foi dedicado às falas dos deputados federais favoráveis e contrários à pauta. Nessa matéria do portal Cannabis & Saúde, você poderá ler um resumo com as falas dos parlamentares.
Após quase 3h de falas dos políticos, os convidados tiveram a palavra. O primeiro depoimento foi da Dra. Carolina Nocetti, coordenadora da American Academy of Cannabinoid Medicine. A médica condenou a falta de empatia dos opositores ao plantio de Canabis para com a dor dos pacientes. Ela também reclamou que “ainda ter que ouvirmos que só o CBD serve e só para epilepsia? Cansamos. Isso já foi superado, não temos mais tempo para isso!”.
Na sequência, falou o vice-presidente do Conselho Federal de Medicina, Emmanuel Fortes. O médico declarou: “o CFM tem uma posição muito clara: não concordar com o plantio em território nacional”. Destacou que a Anvisa já autorizou a venda em farmácias e a importação de derivados. Cabe lembrar que, em 2019, o CFM produziu um documento chamado o decálogo da maconha, em que reconhece apenas os efeitos do CBD e apenas para epilepsia, a mesma postura que foi criticada pela Dra Nocetti na fala anterior.
As falas que se seguiram foram sempre de um representante contrário e outro favorável. Quase todas as declarações contrárias levaram o assunto para o uso adulto da maconha e o combate ao narcotráfico. A exceção foi o psiquiatra Ronaldo Ramos Laranjeiras, professor da USP e diretor da unidade de pesquisa álcool e drogas da Unifesp. O médico criticou o que chamou de partidarização do debate, que deixa a ciência de lado, mas acabou fazendo também um discurso político.
“Ninguém pode ser contra o uso compassivo de qualquer medicação. Na história da Medicina, usamos opiáceos, nicotina, álcool. Mas o que está se debatendo no PL 399 é a legalização da maconha. E não há nenhuma evidência científica favorável a essa legalização ampla que esse projeto tenta impor à próxima geração de brasileiros. Nenhuma associação médica internacional apoia esse uso amplo. A OMS não faz isso. O FDA não aprova o uso de derivados da maconha, apenas para uso refratários”.
Na verdade, em dezembro de 2020, a OMS retirou a Cannabis do Anexo IV da convenção única de narcóticos, que é uma classificação das substâncias cujo potencial terapêutico não deve ser explorado. Significa que a Organização reconhece os efeitos medicinais da Cannabis. E sobre o FDA, análogo à nossa Anvisa, o Dronabinol, o nome farmacêutico do THC, é um medicamento aprovado pelo órgão há mais de 35 anos.
Assista a comissão geral do PL 399 na íntegra
E o PL 399?
O próximo passo do PL 399 agora é a sua votação entre os membros da comissão especial criada justamente para debater o projeto. Caso 52 deputados ou mais façam um requerimento, o projeto será votado em plenário. Depois, se aprovado, segue para o Senado. Aprovado no Senado, vai a sanção presidencial. O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) já disse que irá vetar. Porém, os vetos podem ser derrubados pelos senadores.