Você sente que está sendo examinado ou tem receio de que agirá de maneira constrangedora ou humilhante em situações sociais? Evita situações que causam ansiedade ou as enfrentam com muito medo? Acha que fica mais ansioso do que deveria diante das situações do dia a dia? Isso tudo atrapalha sua vida, e não há nenhum outro fator que possa explicar isso?
Segundo o Manual de Diagnóstico e Estatístico dos Transtornos Mentais (DSM-V), publicado pela Associação Americana de Psiquiatria, esses todos são sinais de que você pode estar sofrendo de Transtorno Ansioso Social Generalizado (TAS), condição popularmente chamada de fobia social.
Mas você não está sozinho. Presente em 13% dos brasileiros, é uma das condições de ansiedade mais comuns e está associada a prejuízo no ajuste social aos aspectos usuais da vida diária, aumento da incapacidade, disfunção e perda de produtividade. O TAS tende a seguir um curso prolongado e contínuo e raramente é resolvido sem tratamento.
O problema é que os medicamentos atualmente disponíveis são muito pouco eficazes, sendo que apenas 30% dos pacientes alcançam verdadeira recuperação ou remissão da doença. Novas abordagens terapêuticas são necessárias para atacar com efetividade a condição.
Esse caminho pode estar nas propriedades da Cannabis. Pesquisas já sugeriram que indivíduos com TAS têm maior probabilidade de recorrer à Cannabis sativa para se automedicar, do que em outros transtornos de ansiedade.
Entretanto, estudos realizados pelo Dr. Alexandre Crippa, chefe do departamento de Neurociências e Ciências do Comportamento da Universidade de São Paulo, apontam que a relação entre Cannabis e ansiedade é paradoxal.
Embora muitos usuários de maconha fumada relatem a redução da ansiedade como motivação para o uso, episódios de intensa ansiedade ou pânico estão entre os efeitos indesejáveis mais comuns do consumo da planta.
Parte da explicação para essa contradição está no fato de que doses baixas de THC geram efeitos semelhantes a ansiolíticos. Mas THC em grande quantidade pode proporcionar o efeito oposto.
Dr. Alexandre Crippa palestra sobre maconha, canabinoides e a sociedade durante o USP Talks
Já com o CBD é diferente
Pesquisas em voluntários saudáveis mostrou que o canabidiol tem capacidade de atenuar a ansiedade provocada pelo THC.
Já os estudos em animais encontraram no CBD efeitos semelhantes aos medicamentos ansiolíticos. Essas evidências abriram caminho para testar a eficácia do CBD em pacientes diagnosticados com TAS.
A pesquisa, realizada no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto em parceria com a Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto, separou um grupo de 24 pessoas diagnosticadas com TAS, mas que nunca receberam qualquer tipo de tratamento, além de outras 12 saudáveis como grupo de controle.
Todos tinham que preparar um discurso de quatro minutos para ser lido em frente a uma câmera de vídeo, enquanto assistiam à própria imagem na televisão. Entretanto, duas horas antes da atividade, metade dos pacientes diagnosticado com TAS recebeu uma dose de 600 mg, a maior dose encontrada na literatura científica para tratamento ansiolítico.
A outra metade dos pacientes com TAS receberam um comprimido falso, placebo, sem o CBD. Já os outros 12 participantes saudáveis não receberam nada. Todos foram submetidos à testes fisiológicos e psicológicos antes e durante o discurso para medir o nível de ansiedade.
E deu certo. O grupo de que recebeu o placebo apresentou um nível de ansiedade significativamente mais alto que o grupo de controle, com maior maior comprometimento cognitivo e desconforto, algo já esperado em pessoas com TAS.
Já os que receberam a dose de CBD apresentaram redução considerável da ansiedade, com desempenho cognitivo melhor e sem tanto desconforto. Os resultados foram semelhantes ao do grupo de pacientes saudáveis.
“Esses resultados preliminares indicam que uma dose única de CBD pode reduzir o efeito de aumento da ansiedade provocado pelo teste de fala em público em pacientes com TAS, indicando que esse canabinoide inibe o medo de falar em público, um dos principais sintomas do distúrbio”, diz o estudo.
Outro fator interessante foi a autoavaliação que cada um fez de seu discurso. Entre os que receberam CBD, quase ninguém se avaliou negativamente, fator importante no melhora do funcionamento social em pessoas com TAS.
Os pesquisadores ressaltam que os resultados desse estudo deve ser interpretado com cautela, apontando a necessidade da realização de novas e mais amplas pesquisas. No entanto, destacam que o “CBD tem vantagens importantes em comparação com os agentes farmacológicos atualmente disponíveis para o tratamento da TAS.”
O consumo prolongado de CBD não provoca o desenvolvimento de tolerância ou dependência da substância, assim como, possivelmente, reduz a chance de utilizar outras drogas. O fato dos bons resultados terem aparecido com apenas uma única dose de CBD é uma indicação da agilidade do tratamento.
“Assim, devido à ausência de efeitos psicoativos ou cognitivos, a seus perfis de segurança e tolerabilidade e a seu amplo espectro farmacológico, o CBD é possivelmente o canabinoide com maior probabilidade de ter achados iniciais de ansiedade traduzidos na prática clínica”, concluem os pesquisadores.
Referência: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3079847/